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terça-feira, 9 de março de 2010

Última gravação de Zé Rodrix dá corpo a canções francamente românticas


No início dos anos 70, entre o protorrock nacional e as canções de protesto, diferentes movimentos musicais emergiam, buscando lugar entre a herança bossanovista e a conexão com um público jovemNelson Gobbi, Jornal do Brasil

RIO DE JANEIRO - No início dos anos 70, entre o protorrock nacional e as canções de protesto, diferentes movimentos musicais emergiam, buscando lugar entre a herança bossanovista e a conexão com um público jovem.

Abrigados no gênero guarda-chuva MPB, os próprios grupos e artistas ganharam rótulos que, se por um lado davam uma unidade necessária à sua entrada no mercado fonográfico, por outro não contemplavam com exatidão todas as nuances de suas propostas, a exemplo do rock rural, que reuniu nomes como O Terço, Zé Geraldo e Sá, Rodrix e Guarabyra. O trio - e posteriormente dupla, com a saída de Zé Rodrix em 1973 – construiu sua trajetória dividido entre as referências do início da carreira e a adesão à canção popular. Reunidos novamente após 2002, com o lançamento do CD e DVD ao vivo Outra vez na estrada, os três souberam manter este equilíbrio em Amanhã, disco com 12 músicas inéditas que chega às lojas quase um ano depois da morte de Rodrix.

Riqueza instrumental

O mérito mais evidente do álbum é a falta de pudor em ser popular, em que pese a sofisticação dos arranjos, que muitas vezes remetem às experiências do início de carreira, a exemplo do tema de abertura, Sonho triste em Copacabana. A produção de Tavito – que traz ao estúdio uma riqueza instrumental cada vez mais rara atualmente, até mesmo em obras de medalhões da MPB – dá corpo a canções francamente românticas, como a faixa-título, Nós nos amaremos, Logo eu saudade e Amar direito, com seu belíssimo arranjo de acordeon. Apesar de Os dez mandamentos do amor pesar demais a mão e destoar do clima do disco, todas as outras têm potencial para figurar junto a sucessos da dupla Sá e Guarabyra como Dona e Espanhola.

A vertente “rural” do trio ganha reforço com Cidades meninas, compostas sobre municípios mineiros batizados com nomes femininos, a ecológica Dia do rio e a neo hippie Caminho de São Tomé. Mesmo nas faixas de temática urbana, as quais ressaltam a origem carioca do grupo, está presente a ambiguidade das referências do campo e da cidade, a exemplo da já citada Sonho triste em Copacabana e Novo Rio, que cria um diálogo interessante entre Futuros amantes, de Chico Buarque, e outro de seus sucessos enquanto dupla, Sobradinho.

É impossível deixar de relacionar o caráter póstumo legado ao disco a uma de suas melhores composições, Marina, eu só quero viver, na qual versos românticos como “Eu não quero fazer a viagem/ Me faltam dois contos e um pouco de coragem” remetem involuntariamente à perda prematura de Zé Rodrix. Talvez, contudo, seja essa a melhor forma de homenagem, com a mesma despretensão e espontaneidade com que o trio compôs uma das melhores músicas da década de 70, Mestre Jonas.

21:39 - 08/03/2010

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