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sábado, 18 de julho de 2015

O poeta da cidade acocorado no sertão: Francisco Assis de Sousa Lima



*publicado pela Revista Brasileiros-junho/2012*

Assis Lima é médico, poeta, mestre em Psicologia Social pela USP, cearense, mas há muito tempo em São Paulo, onde aperfeiçoou o ofício de marceneiro/engomador da palavra de um nordeste amalgamado em suas tradições medievais, repaginadas na boca do povo e cuspidas na renda poética do autor.
Assis lida com a palavra na clínica, cobiçando seus minerais imaginários, como todo escutador do mundo e sem fastio, mas não desgarra seu ouvir a poética do sertão, ruminando os filamentos da dor e da alegria:

“… Colhendo o poema e cada palavra
em lâmina e pétala
No afiado gume do tempo…” (Poemas Arcanos)
“Esquecida nas eras
a língua de meus avós
que voz tão minha,
Voz de três línguas…” (Poemas Arcanos)

Pesquisador da cultura popular, ele passeia por grandes autores com deslizar de quem conhece. Autor da obra Conto Popular e Comunidade Narrativa (1985, com prefácio de Antonio Candido), organizou Contos Populares Brasileiros (Ceará, 2003). Também é parceiro (antigo) de Ronaldo C. Brito em trabalhos, como o roteiro/trilha do filme Lua Cambará (1977), a trilogia Festas Brasileiras(Baile do Menino Deus – 2011), O Pavão Misterioso (Cosac Naify, 2003), além de Poemas Arcanos(Ateliê Editorial, 1998), Marco Misterioso (Dobra, 2011) e Chão e Sonho (Dobra, 2011).
Destaco aqui Baile do Menino Deus, que virou peça de teatro e expõe um Natal brasileiro sem Papai Noel, neve ou guirlandas, trazendo a cultura popular nordestina à baila por meio de figuras como Mateus, bumba meu boi, Catirina, caboclinhos, cigana, pastora, além de elementos da cultura afro – tudo conduzido por ações do brincar infantil, que faz puxar o baile.
O cimento da construção poética de Assis Lima é de argamassa milenar do povo, em que ele diz seu lugar, cinze seus olhares de inquietude sobre o mesmo e afina a pontaria:

“… Consultei meus alfarrábios
começando com Cascudo.
Foi como subir na árvore
da origem que há em tudo.
Da árvore tirei a lasca,
Da lasca tirei a casca
Do cascalho o ouro fino.” (Marco Misterioso)

Mas o engomador das palavras tem vários ponteiros e, em que pese o sumo popular lhe encrostar, ele salta (ou dá de garra) para um outro requinte, com os fagotes e flautas que lhe inspira Rilke:

“Na tarde verde da tua lembrança
de onde me vens
Em inviolado silêncio
frágil como a fortaleza do meu grito
Sou espera…” (Poemas Arcanos)
“O tempo me ensinou a ruminar
Eu rumino o bredo dos séculos que comi.
Rumino como velhos feiticeiros
a memória das eras antigas.
Minha memória é feitiço que dobra o tempo que marca o ponteiro do sol,
Que deixa a lua reinar
No sangue moreno da terra…”

(Poemas Arcanos, idem, 2008, p.61)

E fechando:

“Tragado pela noite,
salvou-me a Madrugada.” (Chão e Sonho)


*É paraibano, mestre e doutor pela ECA-USP. Professor de Teoria Literária na Anhembi Morumbi, professor colaborador da ECA-USP, Fundação Escola de Sociologia e Política-FESP, além de contista e poeta com livros publicados (paulo@brasileiros.com.br).

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Jozailto Lima: um minerador do poema ou papa-vento da palavra.

( Publicado na Revista Brasileiros-SP)


A poesia: uma questão de palavra, diz o poeta Jozailto e prosegue...” É um estado de palavra. É um estandarte feito de palavras e suor. Claro que, por vir disso, da palavra e do labor, ela está a serviço da humana genteO olho da pedra. Tudo isso, sendo pedra. Cartesiana. Meio matemática. Poesia é pintura feita a pincel de palavra. Carvão verbal

Jozailto Lima é jornalista e poeta e, como diria  Cacaso, “não nega sua raça, faz verso por pirraça e também por precisão”. Nasceu em Várzea do Poço, BA, em 11.11.1960, onde viveu até os 19 anos e está em Aracaju há vinte e três. É autor de quatro livros - “A Flor de Bronze e Outros Poemas de Mediamor”, 1986, trazido de Feira de Santana, “Plenespanto”, 1996, “Retrato Diverso”, 2004, e “Viagem na Argila”, 2012. Os três primeiros, premiados na Bahia e em Sergipe. Sua poesia faz profunda inquirição do sentido da existência, como lhe anteviu  Carlos Drummond de Andrade, em carta remetida em 1985: “gera e transmite emoção no seu grave sentimento de vida”. Ou, como disse Antônio Carlos Viana, “a poesia de Jozailto é uma poesia de ideias, enunciadas com forte tom emocional”. “Sem deixar de ser um homem do seu tempo, de seu torrão e, por consequência, do mundo”, arremataria Ronaldson Sousa. É diretor de Jornalismo do Cinform.

O poeta falou neste ano para a Revista Brasileiros, entre ondas e ventos da praia; ele é um disparador de palavras e assim atira versos, numa circunferência aberta. Amigo de poetas nacionais, incentivador dos que aparecem , mas não se desapega de Roverval Pereyr, poeta da Bahia, de Feira de Santana, Hunald de Alencar, José Ronaldson e Maria Lúcia Dal Farra, todos de Sergipe, Aracaju, entre tantos que ele louva, afora os clássicos do Brasil e do mundo. Ele é um comedor de livros sem indigestão.
Mas vamos digeri-lo assim, com seus poemas:

MÁCULA
Uma certa cicatriz/Que tenho e trago
Talha em mim/Esta dicção assim
Meio acre meio doce/Meio cica todo estrago.
(de “Retrato Diverso”)

ou

ECLESIASTES
Para Acácia Rios

Minha arma sou eu mesmo
O sol e a lua ajudam-me/a puxar o gatilho diário
na direção do mesmo alvo/na direção do mesmo ermo
Eu mesmo sou minha mira/Ardo. E ninguém, debaixo
do sol ou da lua, me desarma/Minha arma é minha alma
(de “Plenespanto”)

E, por fim, dá-nos uma chance de espiarmos inédito dele, do próximo livro (o quinto).

E ainda os lobos:

SEIVA (UMA POSSIBILIDADE)
sonho de morar no papel/e em sua seiva desidratada.
solenemente, habitar a celulose./ser o elo entre palavras,
traças e os sais da eternidade./ser madeira e ganir o segredo
da vida inteira no eixo do tempo./renovar a cada folha lançada
da árvore ao chão e do chão à árvore./abreviar o sonho da carne
e deliberadamente ser hermético/e uno e indivisível como a seiva.




quarta-feira, 17 de junho de 2015

Quinteto Violado -QV -41 Anos. : temperando a música brasileira e internacional


(Publicado na Revista Brasileiros
.SP)












No caminho da Mata ouvi um canto,
Asa na serra respondeu
Carcará num razante em rio sêco,
....
É o canto da terra,
Orvalho na serra,
A caatinga fulorou,
Mata Branca, padroeira...( Mata Branca = Caatinga -M.Melo)

 “Quando olhei a terra ardendo, qual fogueira de S. João...”( A. Branca.L Gonzaga/H.Teixeira  ) estas e outra músicas de Gonzaga  faziam parte do nosso acervo de família.Afora isto tinha Marinês e sua Gente,Rosil Cavalcanti  e J. do Pandeiro etc..Na época era o baião que se exportava para  o sudeste.Mas aprendi com o QV,  via Marcelo Melo,(violado)pesquisador e compositor da MPB a condição universal do nosso regional..
Em janeiro de 1970 o conjunto -apresenta-se pela primeira vez, sem nome próprio Q. Violado, na F.de Filosofia  UFPE. Em 1971, apresenta-se Nova Jerusalém (F. Nova PE), daí definitivamente: "os violados .

O quinteto, reacende nossa música nos anos 70 dando um caráter clássico/popular  à nossa música , dita regional, que não entendo o porquê, afinal não há música  que não tenha um pé no regional.

O Quinteto assim diz o poeta Dourado:
...” Paulo Freire Educação
Cangaço, Lucas de Feira
Na peleja e na rima
Malazarte e Canção...
tem Quinteto Violado
O Barro de Vitalino  ... “(http://migre.me/8appP)
Ou Xico Bizerra, citado  pelo saudoso Toinho Alves -violado:
’’ …A canção é a ferramenta

para violar luares

E por todos os lugares 

enluaramos violas ..”( http://bit.ly/yHD6S8)


Afora isto, o QV, trouxe-nos a palavra musicada e a cena dos folguedos/ritmos: cavalo marinho, pastoril, forro, baião,frevo ,xote, coco, cordel-emboladas,coco,maracatus, ciranda, o bumba meu boi etc, além de cantar Vandré( com quem gravou um LP/CD),Capiba,J.do Pandeiro ,Adoniran  etc. e composições próprias

Os violados, em suas  pesquisas ,trouxeram sangue  quente e virtuose à música  brasileira, mostrando ao mundo por seu muitos discos ,CDs  DVDs, um Brasil palavrado de expressões novas e arranjos Eles, ,juntam o popular e erudito, passando por filigranas jazistícas, sem tirar o foco de valorização do nacional, em que violão,contrabaixo,viola e,flauta,e safona, bem como teclados, engendram com as  suas vozes em  um novo melódico da MPB.

O primeiro  disco-LP-, Quinteto Violado em concerto,  Philips :1972, em que se incluía A. Branca  sucesso nacional e internacional com  prêmios recebidos .

Amigos do saudoso Gonzaga,em época de cáida midiática/fonográfica  deste, o quinteto realumiou o mesmo.Ele era padrinho dos violados , como assim o foi Hermilo B. Filho e Marcos Pereira, com quem o QV participou do projeto Música Popular do Nordeste 1973.

Gonzaga, certa vez, na década de 1980 na TV Cultura, predicou o QV de “sustança”, “tutano do corredor do boi”, e também “Padim Cícero”, “Frei Damião” e “Lampião.( http://bit.ly/yjVa7g)
J. Teles, PE, jornalista, pesquisador da MPB, lançou  -LA VÊM OS VIOLADOS da Ed. Bagaço-Pe, 2011vale conferir, assim como a produção do quinteto em seu site (http://migre.me/8arVN)