REDES

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Os engajados, os ‘isentões’ e os hedonistas... Por Sidney Rocha e Paulo Vasconcelos

Publicado pela Sao Paulo Review
http://bit.ly/2uyOVL5
Em tempos de tantas fagulhas, de dilaceramento de propósitos, insegurança de futuro, refleti com Sidney Rocha sobre a relação entre politica e literatura no incendiar de novos cenários em nosso País. A literatura, se não é o espelho, é um encontro de propósitos cujas demandas necessariamente são políticas, e isto em todos os gêneros, seja na crônica, na poesia, no conto ou no romance. Escrever, mesmo em estados ficcionais, é do homem e suas circunstâncias.
Literatura e política são, pois, binômios fundantes da escritura, ou uma etopoiética se não de engajamentos políticos, acentuados ou não como foram João Cabral de Melo Neto, Thiago de Melo, Joaquim Cardozo, Verissimo, Jorge Amado, Graciliano, Jose Lins do Rego, Ruffato, entre tantos, afora os latinos como Neruda, Benedetti, Cortázar, Garcia Márquez Otavio Paz , Soler…..
Para tanto, buscamos escutar alguns nomes de nossa literatura, de modo que possamos nos aproximar do tema e visualizarmos esse par que atravessa nossa história e compõe na contemporaneidade seu tecido do devir.
No último dia 31 de março, subia ao pequeno púlpito, ao lado da presidente Dilma Rousseff, no Palácio do Planalto, um dos maiores escritores brasileiros vivos: Raduan Nassar. Sem nenhuma filiação partidária, e longe dos holofotes literários, o autor de Lavoura arcaica se juntava a outros intelectuais como Chico Buarque e Eric Nepomuceno, por exemplo, para deixar pública sua atuação contra o impedimento da presidente, e acendia luzes também sobre a função ou imagem do escritor brasileiro em momentos como esses.
Será um romance proletário?” A pergunta vem da epígrafe de Cacau, de Jorge Amado (na foto, 1912-2001), publicado em 1933. Nesse mesmo ano, Pagu, pseudônimo da poeta comunista Patrícia Rehder Galvão (1910-1962), lançava seu romance Parque industrial, onde apontava dois universos de trabalhadores nas cidades: os militantes-conscientes e os alienados. Sem meios-tons.
Daquela década não faltam exemplos de escritores engajados, de quem já não se falava à época — e hoje muito menos — como Ranulfo Prata (Navios iluminados, 1937) ou, antes, Juvêncio Campos (Gororoba, 1931). Assim, “literatura proletária” e “realismo socialista” (como entende G. Struve: “criação de obras de elevado nível artístico, marcadas pela heroica luta do proletariado”) eram termos de uso corrente entre escritores do Brasil.
Para discutir a relação entre literatura e (ou versus) política, falamos com Cristhiano Aguiar, autor de Recortes de Hannah, vencedor do Osman Lins de Literatura;Demetrios Galvão, poeta, editor da revista Acrobata e professor universitário; o poeta Lau Siqueira, autor de Poesia sem pele; Micheliny Verunschk, autora de Nossa Teresavida e morte de uma santa suicida, vencedora do São Paulo de Literatura, e o critico e escritor Nelson de Oliveira, autor de Fábulas, ganhador do Prêmio Casa de Las Américas.
Outros autores e autoras, de direita ou esquerda, foram convidados, mas preferiram não participar da enquete. Um deles se justificou assim: “Escritores têm opinado demais sobre tudo.”
Outros simplesmente reforçaram a ideia antiga de que escritores-devem-somente-escrever. E com isto, sem saber, confirmaram a velha declaração do russo Mikhail Bulgákov (1891-1940): “Peço ao governo soviético levar em consideração que não sou um político, mas um escritor.” Sem deixar clara a linha que separa um do outro.
Toda arte é engajada? O assunto não tem fim. Mas seria toda arte propaganda? Assim pensava George Orwell (1903-1950). Demetrios Galvão discorda: “A arte é um espaço que produz visibilidade. Aí o artista escolhe aquilo que pretende mostrar.”
Antonio Moura também considera Orwell reducionista nesse ponto. “É como cortar as seis cabeças da hidra, deixando-lhe apenas uma. Quando isso acontece, geralmente vem a serviço de um Estado totalitário, tirando da literatura o que lhe é mais precioso: a liberdade de expressão.”
Mais contundente foi Gueórgui Plekhánov (1856-1910): “Se um escritor emprega argumentos lógicos em lugar de imagens, ou se as imagens que criou servem-lhe para demonstrar tal ou qual assunto, não se trata de um artista, mas de um publicista, mesmo que escreva, em vez de ensaios e artigos, romances, novelas ou peças de teatro.”
Então, até onde cabe, se é que cabe, o envolvimento das artes literárias no gamepolítico?
Para Micheliny Verunschk, “o capitalismo tem medo da literatura, da grande literatura, porque ela é libertadora.” Sem esquecermos de a história ter comprovado, com uma quantidade enorme de exemplos, o quanto o comunismo teve e tem mais medo ainda.
“Quem gostaria de viver no mundo criado pelas obras do Marquês de Sade? Eu mesmo, não.” Pergunta e responde Aguiar. “Não concordo com muitas das ideias políticas de Balzac, Borges ou Bioy Casares. E, mesmo assim, estes autores me influenciaram bastante.”
Lau Siqueira, “cidadão assumidamente de esquerda”, como se define, com atuação política também como gestor público, defende ideia bem clara quanto à sua própria obra e os laços com a política: “Acho que Brecht cuidava bem disso. Mário de Andrade foi o primeiro gestor de política do Brasil, Drummond foi chefe de gabinete de Gustavo Capanema, Neruda e Maiakovski eram do PC. Mas, quanto a minha obra (…) não guardo nem procuro guardar nenhuma identidade política. Faço meus passeios minimalistas e neobarrocos, às vezes, lirismos radicais, mas sem laços com a política.”
Contudo, se nota atualmente militância por certo “deboísmo” literário ou militância do não-engajamento?
— Você está falando dos isentões? — pergunta Micheliny.
— Vivemos a ditadura do hedonismo — reflete Nelson de Oliveira.
— Ora, ninguém se retira da História, ninguém se coloca acima do seu tempo — acrescenta Verunschk. — Interessam-me as lutas do povo do qual sou parte, suas narrativas e os modos pelos quais se colocam de pé frente às injustiças.
— Esse debate é profundo e é preciso muito esforço para ser resolvido, não dá pra ficar ‘de boa’ diante desse quadro social — espichou Demetrios.
 Pois é — acrescentou Moura — o deboísmo é simpático nas relações sociais, mas a arte e a cultura precisam ser constantemente debatidas. Num País patético e injusto como o nosso, deve-se lutar por cidadania, e a cidadania também implica em falar por si por aquilo que defende.
Aguiar vai buscar na sua obra as relações mais aparentes:
— Observando meu livro, ainda inédito, vejo uma série de alegorias sobre ditadura militar, a desocupação do Pinheirinho, tensões raciais, regionais, e política (…) há sempre um fundo de discussão a respeito do sagrado, por exemplo, e isso se mistura a uma já citada alegoria sobre violência do Estado, certos radicalismos, temas de urgente discussão hoje em nosso País.
— Quando a vida radicaliza, precisamos saber de que lado estamos — afirma Siqueira.
— Esse posicionamento de modo direto é necessário a qualquer um, independentemente de ser escritor ou não — emendou Moura.
— Minha militância é com a cultura, a literatura. Minha bandeira é a da tolerância e dos afetos — reafirma Galvão.
— Quanto a mim, não creio no Estado, nem no governo, seja de direita ou esquerda — diz Nelson de Oliveira, desconfiado até da própria sombra da individualidade, no conjunto de sua fantasia ficcional, por isso atende por outros nomes como Luiz Bras.
Micheliny Verunschk argumenta que “toda obra literária é política, no sentido de que todo romance ou conto ou poema se filia a valores e compreensões de mundo bem marcados. Não há obra neutra, portanto.”
Certa vez, num amplo debate de escritores latino-americanos, o escritor mexicano Pablo Soler Frost resumiu muito bem o assunto: “Literatura política quer dizer literatura comprometida. Durante todo o século XIX e XX até a queda do Muro de Berlim, a literatura política tomou partido dentro do terreno das ideias. Mas hoje, tudo é política: o corpo, nossa atitude com os animais etc.”
No texto “Os escritores e o poder”, Octavio Paz abordou o tema por outro ângulo:
“A política encheu de fumaça o cérebro de Malraux, envenenou as insônias de César Vallejo, matou García Lorca, abandonou o velho Machado num povoado dos Pirineus, prendeu Pound num manicômio, desonrou Neruda e Aragón, expôs ao ridículo Sartre, deu razão tarde demais a Breton… Mas não podemos renegar a política; seria pior que cuspir contra o céu: cuspir contra nós mesmos.”
Em entrevista à célebre The Paris Review (que inspirou o projeto da São Paulo Review), Ernest Hemingway respondeu à questão “em que medida considera que o escritor deve envolver-se nos problemas sociopolíticos de sua época?” desta maneira:
“Cada um tem sua própria consciência, e não deveria haver regras para o funcionamento da consciência. A única coisa de que podemos estar seguros a respeito de um escritor politizado é que, se sua obra perdura, alguém terá de passar ao largo da política quando o leia. Muitos dos escritores chamados politicamente comprometidos mudam suas ideias políticas frequentemente. Isto é muito excitante, para eles e os resenhistas político-literários. Às vezes até devem reescrever seus pontos de vista… e apressadamente. Talvez tudo isso pode respeitar-se considerando que é uma forma de busca da felicidade.”
Uns mais para um lado, outros para o outro, companheiros de viagem, aqui, engajados ou não, têm um centro em comum: a obra literária deve pensar e refletir o mundo e o humano. A pauta política surge de modo natural, do compromisso com a linguagem.
Há uma linguagem, na literatura, de esquerda, e outra, de direita, no Brasil? A literatura de direita é a mesma que produzia Guimarães Rosa, ou Jorge Luis Borges, ou Ezra Pound, ou Céline? E da literatura brasileira, quem tem medo, hoje? Talvez a literatura tenha se cansado de ser bela, decorativa, recatada e “do lar” e queira reivindicar um pouco mais das vísceras do mundo e menos dos intestinos dos seus autores. Sem recorrermos a detestáveis infográficos, o que pensa mesmo o escritor deste século e o quanto fazem pensar suas obras? Será que estamos diante do tipo de artista de Hoffmann — mencionado pelo crítico francês Sainte-Beuve (1804-1869): “com o gênio inquieto, os olhos assombrados – místicos sem fé, gênios sem obra, almas sem órgãos?”
Talvez, ainda recatados e do lar, alguns escritores brasileiros se sintam bem à vontade nos salões e feiras, com literatura tipo exportação, porém se melindrem com palavras tais como produto, mercadoria, política, mercado, indústria da literatura. Talvez saturados de si mesmos, dessa (com permissão da palavra) “arte” individualizada — remem melhor em direção a uma “arte” contextualizada.  Ou, como diz Nelson de Oliveira, que anda pregando nas suas oficinas Brasil afora nova literatura ou novíssima indústria bélica  — e com ele talvez estejamos melhor: “Que meus livros sejam disparos à queima-roupa. Essa é a única argumentação política na qual acredito, neste momento nojento. Livros-revólveres.”
Nada como pensar e tecer a fibra densa do hoje e do amanhã com fachos de sobriedade e consciência política: isso a literatura pode nos doar, sugerir. Ela é capaz de promover o entendimento do homem e suas idiossincrasias, sobretudo no âmbito da política e neste momento atormentado em que o País mergulha. Um período em que, muitas vezes, o jornalismo consagrado não nos salva, como uma literatura do cotidiano contingenciada por interesses dos grandes grupos de mídia e a serviço de uma elite desnutrida de face não ilustrada, submetida aos desígnios do capital.
*
Sidney Rocha é escritor. Vencedor do Prêmio Jabuti com O destino das metáforas (contos, Iluminuras, 2011). Autor de Matriuska (contos, Iluminuras, 2009) e dos romances Sofia(Prêmio Osman Lins) e  Fernanflor (Iluminuras, 2015). Este ano publica Guerra de ninguém (contos), também pela Iluminuras
Paulo Vasconcelos é escritor, crítico literário e colaborador da São Paulo Review

quinta-feira, 27 de julho de 2017

SUOR, PINGA E SAMBA - FLIP



Por Emerson Lopes, São Paulo , PUC.SP, jornalista da área de Cultura e Comunicação colaborador do Blog -Palavras dos Brasileiros





Como parte de sua cobertura da Flip 2017, a Folha de S.Paulo de hoje, 27 de julho de 2017, traz uma "crônica" (sic) cujo título é "Com Lima Barreto, Flip retoma a boêmia romântica da belle époque". O espaço de uma ou duas linhas reservado para um título ou manchete deve dar conta de anunciar um texto inteiro. Porém, esta necessidade causa um reducionismo -intencional ou não- a respeito do que a matéria aborda realmente.

Ao lermos o texto, percebemos que o autor trata não da mundialmente conhecida "belle époque" francesa ou estadunidense, mas sim de uma possível versão brasileira. Mais especificamente a carioca, na tentativa de fazer um paralelo entre o que acontecia na época do homenageado Lima Barreto e o que pode ser conferido no primeiro dia do festival literário. O esforço é válido. Porém, a cobertura jornalística realizada por colunistas sociais, blogueiros, etc. e a presença de celebridades das mais variadas áreas, todas devidamente clicadas, snapchatadas e instagramadas não nos faz pensar no burburinho intelectual nos bares e cafés parisienses -nem imaginar as famosas reuniões na casa de Gertrude Stein- durante os anos 20 do século passado.

Na verdade, mesmo com as mudanças na edição deste ano, caso o objetivo do texto seja saudar a segunda década do século passado, seria melhor relacionar a Paraty de 2017 a outra cidade. Nova York. Ali, a belle époque apresentava características distintas daquelas presentes na metrópole europeia. Embora os anos 20 em NYC também tivessem como trilha sonora o jazz -no Harlem ou nos apartamentos de alguns ricos da cidade, quem criou a imagem da época naquela cidade foi o casal Zelda e F. Scott Fitzgerald, com seu comportamento extravagante, que preencheu por um bom tempo as páginas dos periódicos com fotos e notas em colunas sociais a partir do sucesso de crítica e público de seu primeiro romance, "Deste Lado do Paraíso". Era inaugurada assim a era das celebridades

Quanto ao Rio de Janeiro no mesmo período? Certamente a cidade continuava com clima quente e mais gente transpirando suor do que literatura, sempre ao som do samba, rebento nascido na década anterior e batizado com o título "Pelo Telefone" pelo seu pai, Donga, entre uma e outra golada de pinga.

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Ao poeta , no dia do escritor
















A poetisa Selma Vasconcelos, pelo seu facebook, homenageia os poetas no seu dia, se bem que todos os dias. ou nem todos, são dos poetas, e sim do ser e de seus sonhos, desta feita  dá no mesmo :o poeta é um sonhador ...e Freud e Clarice estão de mãos dadas.Paulo Vasconcelos


Diz  a poetisa :

....
A psicanálise tem-se ocupado sempre com o mistério do processo criativo do homem através da arte ,particularmente da literatura e, ainda mais,da poesia. A Freud já interessava "em que fontes o poeta se embriaga para criar suas obras".

Considerava o pai da psicanálise que à representação das coisas ( domínio do inconsciente e fase pre´verbal) o poeta teria acesso privilegiado pelo seu talento e sensorialidade especial. O prosseguir desta viagem , a partir do obscuro, deságua na representação das palavras. " A poesia é o desenho das palavras".

É de Clarice , a Lispector, o texto a seguir que bem exemplifica o " sofrimento" da criação:
" minha nascente é obscura..meu pensamento com a enunciação de palavras , mentalmente brotando, é precedido por uma instantânea visão ,sem palavras, do pensamento. ...Eu escrevo por meio de palavras que ocultam outras, as verdadeiras...'as vezes a sensação do pre´-pensar é agônica; é a tortuosa criação que se debate nas trevas e que só se liberta depois de pensar com palavras".

Clarice consegue detalhar com preciosismo ,um processo difícil de vivenciar e ainda mais difícil de explicar! Por esta e outras é que Freud considerava ,e com muita razão , que o poeta fala sem saber, aquilo que ele, Freud, chegava a concluir após muito estudo e reflexaõ ( !)





* Selma Vasconcelos, poetisa paraibana radicada no Recife, com várias obras publicadas, na poesia e crônica no Brasil , no exterior;  pesquisadora de Joao  Cabral de Mello Neto, com obra publicada sobre o mesmo.

terça-feira, 25 de julho de 2017

A FLIP DENTRO DE UMA ÓTICA MAIS IGUALITÁRIA


Em que pese meus senões contra essas grandes feiras  literárias, pois na verdade agregam um corporativismo, como em quase tudo neste país  e nao é um apanhado da real literatura do Brasil,  tomei a liberdade de publicar aqui a postagem de um intelectual baiano que respeito e tenho apreço -Prof..Dr.Florisvaldo Mattos.UFBA. A matéria, ou o post, dele no Facebook, comunga comigo e faz menção ao trabalho sério de Josélia Aguiar a quem admiro .
Paulo Vasconcelos.
                                             Foto Facebook-Florisvaldo Mattos
                                                            Foto Facebook Josélia Aguiar


Depois de amanhã, 26, encerrando-se no dia 30, ocorre a 15ª Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), que tem à frente de sua curadoria a jornalista baiana radicada em São Paulo. 

Joselia Aguiar que em artigo publicado no suplemento "Ilustríssima", da Folha de SP, neste domingo, 23, discorre sobre a linha de ação que procurou imprimir na programação, a partir de que o evento homenageia o escritor Lima Barreto e sua obra, um esforço de buscar o que estava fora do centro cultural dominador, baseada na ideia de que os choques culturais são maiores e mais vastos num ambiente diverso. 

Dentro desse esquadro inovador, no sentido de garantir a paridade, orientou a sua diligência no sentido de garantir paridade, como a de aumentar a presença de autores negros (22 homens e 24 mulheres), cobrindo 30% da presença entre escritores convidados. 

Numa festa que sempre optou por priorizar as imposições do mercado editorial, com vistas em destacar quem vende mais, é importante esta guinada no sentido de valorizar uma espécie de subúrbio da inteligência, pois a ideia maior não é privilegiar o leitor especializado, mas abrir horizontes e oportunidades ao leitor de modo geral. 

Esta decisão da jornalista Josélia Aguiar (diplomada pela Facom-Ufba, é bom que se diga, para orgulho baiano) merece aplausos, por divergir do diapasão de posturas adotadas, quase sempre, em tais casos, pelos manda-chuvas culturais do Sul zarolho. Palmas para ela.


domingo, 23 de julho de 2017

A Canção como vibração de um fruto maduro: Fruta Gogoia

                                            fonte :http://bit.ly/2eIvzj5

                                   fonte :http://bit.ly/2eIvzj5
A canção como vibração de um fruto maduro: Fruta Gogoia,

Cantar é saber dizer linguagens, é legitimar a música, a letra, é aumentar o ganho sonoro com a interpretação que se faz. Isso ocorreu com o CD (com 18 faixas) e show “Fruta Gogoia”, com Jussara Silveira e Renato Braz.
Para aumentar a dimensão do fato, o show no Sesc Vila Mariana, na última sexta feira 08.07, estrondou a cena e o público aplaudiu de pé inúmeras vezes.

O álibi foi a homenagem a Gal Costa, 50 anos de carreira, em seu repertório ao longo de décadas. Mas a escolha é que foi esculpir em ferro: difícil, mas acertadíssima. Fizeram  parte  assim  compositores que vão de Tom Jobim a Caetano Veloso, passando por Dorival Caymmi, Jards Macalé, Chico Buarque, Luiz Melodia. 


O SESC  teve a honra de agasalhar este projeto que marcará sua carreira, já longa de grandes produtos culturais. Danilo Miranda estava presente na estreia, no auditório, e não media fogo nos aplausos, junto com outros convidados.

Luiz Nogueira, produtor cultural e musical, teve a audácia de qualidade de se inspirar com perfume da flor de Gal Costa e cometeu seguidas audácias: ao juntar Renato Braz , Jussara Silveira e músicos estonteantes, afora o inesquecível arranjo de Dori Caymmi.

Apresentam-se entre outras músicas “Estrada do Sol”, de Tom Jobim e Dolores Duran; “Vapor Barato”, de Jards Macalé e Waly Salomão; “Folhetim”, de Chico Buarque; “Volta”, de Lupicínio Rodrigues; “Pérola Negra”, de Luiz Melodia; “Sorte”, de Celso Fonseca e Ronaldo Bastos; “Só Louco”, de Dorival Caymmi. Também não ficaram de fora da homenagem “Modinha para Gabriela” e, claro, “Fruta gogoia”.

Renato faz um dupla perfeita incorrigível com Jussara, que, por sua vez, canta com o corpo todo e rearranja o corpo e o vestido com suas mãos que regem por inteiro as canções de modo a dar um outro tom à música. Ela rege muito bem com seus dedos como se violasse a melodia com e no corpo, que também vibra.

Ela é uma cantora de extremo bom gosto e sem audácia de querer ser  insuperável e, assim, torna-se. E, mais, faz brilhar estalos da sua loucura de intérprete. Sua simplicidade é o segredo de seu tônus, que ultrapassa ditames do é que ser uma a cantora: ela é a própria fruta gogoia, é uma moça, é uma joia!

Ele, Renato, na sua forma de estar em cena, passa a tranquilidade dos que tem sede de cantar se encontrado consigo ao vozeirar as canções qual uma viola do mato afinada junto às frutas, as canções. Assim seu violão e sua voz assaltam-nos de emoção e poesia soberba.

O repertório não tem falha, é um repaginação da música brasileira, feito com um cuidado de quem sabe ouvir e redizer.

Os  arranjos tiveram a batuta doce e clássica de Dori Caymmi que tanto já arranjou  para Gal Costa, mas todos os arranjos pensados para as canções do disco traduzem a elegância das composições, chamando um time de músicos conceituados para executar suas faixas. Além de  Dori, que toca violão – no disco – em algumas das faixas; Itamar Assiere, no piano; Celso de Almeida, na bateria; Teco Cardoso, nos sopros; Swami Júnior, no violão 7 cordas; Sizão Machado, no baixo; Bré Rosário, na percussão; e Toninho Ferragutti irrepreensível e deslumbrante no acordeom. Toninho é responsável também pelo arranjo da canção que dá título ao disco. Além disso, Mário Gil faz a produção musical e o violão na faixa “Meu bem, meu mal”.

Algumas canções são acompanhadas por um octeto de sopros, com a nata dos músicos de sua vertente. Outras por um quarteto de cellos ou um conjuntos de cordas. Neste caso, a arregimentação ficou nas mãos do maestro Claudio Cruz, fantástico.

Na estrutura visual, caso do show, disco e no design de imagens de Regina Silveira, que veio de modo mais público mostrar sua raça, seu verniz de extrema beleza estética e que canta com o som. (Cenário: E programação visual do Cd(Fauna Brasiliensis, 2017. Regina Silveira.Criação: Estúdio Regina SilveiraAnimação: StudioIntro. )

"Eu vi o tempo brincando ao redor da voz latejando música. Por isso essa força estranha..."

Isso é que resumiria o disco e o show.


* Disponível Lojas SESC e breve Livraria Cultura



quarta-feira, 19 de julho de 2017

Hoje não vou escrever sobre literatura.....e sim a escalada da violência ( Capturas do Facebook)

Quando o escritor e intelectual tem compromisso público com a verdade e com a denúncia ;a isto dou o nome de responsabilidade de cidadania.. Paulo Vasconcelos





Hoje não vou escrever sobre literatura, minha paixão, que ocupa meu espaço por aqui. Vou escrever sobre a escalada da violência contra trabalhadores rurais, especialmente sobre a morte de dois quilombolas que foram assassinados neste fim de semana na Bahia. Este ano, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra, 48 trabalhadores rurais foram mortos em conflitos fundiários pelo país, quase o total de mortos no campo no ano de 2015 (o último ano de um governo eleito pelo voto popular). 




Após a ruptura institucional que vivemos no ano passado, as bancadas do boi e da bala ganharam protagonismo. Vive-se no serviço público, ao mesmo tempo, uma profunda precarização que culmina na inércia na demarcação de terras indígenas e quilombolas, além da paralisação de políticas públicas diversas para outras populações tradicionais. Essa não é uma preocupação do grupo usurpador que ocupou o Palácio do Planalto para se proteger, em primeiro lugar, das investigações por corrupção, e vem realizando o desmonte das políticas sociais que entraram em pauta na última década. Não haverá solução para os graves problemas fundiários que enfrentamos se não houver manifestação, grito e luta. E nós, que trabalhamos com a palavra, temos um compromisso com o nosso tempo: fazer ecoar em nossa arte a voz dos que lutam por justiça social,



Que o sangue de Junior Mota (foto), liderança da comunidade quilombola de Jiboia, Antônio Gonçalves-BA, o sangue de Lindomar, comunidade de Iuna, Lençóis-BA, e de tantos outros que têm perecido nos últimos meses pelo país, não sejam derramados em vão. Que nossas ações reflitam que essas lutas não são apenas deles, mas de todos que querem um país que faça uma revisão do seu passado de genocídio e escravidão.


@ Itamar Vieira Junior nasceu em Salvador, Bahia, em 1979. É doutorando em Estudos Étnicos e Africanos (UFBA), etnógrafo com pesquisa sobre a formação de comunidades quilombolas no interior do Nordeste Brasileiro. É escritor, autor dos contos reunidos no volume “Dias” (Caramurê, 2012), vencedor do XI Prêmio Arte e Cultura (Literatura – 2012) julgado por comissão composta por membros da Academia de Letras da Bahia. Escreveu também um ensaio sobre canções de Caetano Veloso “Do canto ao "canto": cidade e poesia em Caetano Veloso” publicado em “Imagens da Cidade da Bahia: um diálogo entre a geografia e a arte” (EDUFBA, 2006). Dois de seus contos foram traduzidos para o francês e publicados em revista especializada na França. É autor do livro de contos “A Aração do Carrasco” (Mondrongo, 2017), obra selecionada pelo Edital Setorial de Literatura da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia e que recebeu menção honrosa no edital de criação literária de São Bernardo do Campo - São Paulo - 2016.

sábado, 15 de julho de 2017

O troco

 Maria Lucia Dahl por facebook
O troco

Engraxate, flanelinha, menino de rua, pivete.
Versão moderna do Negrinho do Pastoreio
Zumbi dos Palmares do asfalto,
Rebento do ventre livre
O saldo da escravidão.
Mas que bandeira é esta que imprudente
Na gávea tripudia
Na porta do Hotel Othon
Negociando comida por comportamento bom?
Pivete
Tripulante, vingativo do antigo Navio Negreiro.
Mas que bandeira é esta de colorido berrante,
Vestidos de cobertores, descalços no calçadão?
Vendedores de limão, pivetes.
Sem código, sem lei, sem diálogo
Passa a bolsa aí, tia
Copacabana, de dia.
Frutos de fraudes, licitações, falcatruas,
Bandos de meninos de rua
Aprendendo um beabá:
Dá um trocado dá, dá.
Produto da História do Brasil
Eterna guerra civil.
Pivete: a inversão de papéis.
O troco. Me dá um trocado?
Trocando o roubo do seu futuro
Pela morte de presente
Crianças armadas de verdade por falta de
Revólver de brinquedo
Tentando vencer o medo.
O troco. Me dá um trocado?
Escadinhas de bandidos neste país sem mocinhos
Onde todos são maninhos em progressivo arrastão,
Vendedores de limão, pivetes.
Sem cara nem coração.
Meninos de vida curta, opostos de Peter Pan
Colados aos companheiros
Na porta da catedral
Vergonha e dor nacional.
Crônica de Maria Lucia Dahl.

domingo, 9 de julho de 2017

Hermilo 100 anos: estudioso da obra de Hermilo Borba filho aponta importância do artista por D.PE>

Conheci Hermilo Borba Filho, sua obra é extensa e vai 
do Romance, conto, teatro  à ensaios.Um homem sério 
que deixou marcas na cultura pernambucana e brasileira.
Sua obra extensa é seu grande testemunho que ainda 
muitos brasileiros não a conhecem.
Transcrevo a baixo matéria do Caderno VIVER 
Diário de Pernambuco, Recife, Pe 09.07.2016 ,com o estudioso seus Luis Reis 
Paulo Vasconcelos


 O professor do Departamento de Teatro da UFPE Luís Reis foi responsável por escrever a tese de doutorado Fora de Cena, no palco da modernidade: um estudo do pensamento teatral de Hermilo Borba Filho. O trabalho, que aprofundou o debate sobre o legado do artista cênico pernambucano, passa em revista as diversas atividades nas quais Hermilo se envolveu, desde a atuação, no início da carreira, até seu pensamento crítico e ficcional. Em entrevista ao Diario, o estudioso detalha a importância do pernambucano para as artes cênicas.


No começo da carreira, Hermilo Borba Filho pertenceu ao Gente Nossa e ao TAP, que, na época, já eram grupos importantes do teatro pernambucano. De que forma essa experiência impactou o jovem Hermilo?
Foi o contato de Hermilo com o teatro propriamente dito. Antes, em Palmares, a participação dele no grupo dramático do professor Miguel Jasseli propiciou a descoberta de seu interesse por essa arte; mas é no Gente Nossa, e logo em seguida no Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP), que ele vai ter acesso a pessoas, artistas e intelectuais, com os quais vai dialogar por muito tempo, concordando e discordando, mas contribuindo coletivamente para a consolidação da modernidade teatral em Pernambuco. Entre essas presenças marcantes no Gente Nossa e no TAP, destacaria, naturalmente, a de Valdemar de Oliveira.  



O Teatro de Estudantes do Pernambuco foi o primeiro grupo no qual Hermilo pôde colocar sua visão sobre o teatro de forma plena. Qual o alcance e a importância desse coletivo?
Sua ida para o Teatro do Estudante de Pernambuco (TEP), em 1946, significou uma tomada de posição, uma ruptura, em relação ao teatro feito por Valdemar de Oliveira no TAP. Era um gesto político e poético: tentar levar teatro moderno, de alto nível, a camadas economicamente menos favorecidas da sociedade. O TEP queria sair um pouco do requinte do Teatro de Santa Isabel, ir para as praças; queria seguir o exemplo de Lorca, que levara bom teatro, de graça, para o povo da Andaluzia. Artisticamente falando, era uma fase de descoberta, de experimentação, muito focada no fomento a uma dramaturgia moderna e nordestina. Foi um rico convívio criativo de talentosos jovens liderados por Hermilo.



O início dos anos 60, no qual o TPN floresceu, também via a atuação cada vez maior do Movimento de Cultura Popular (MCP). Como a atuação de Hermilo se relacionou com outros grupos e propostas estéticas de seu tempo?
O Teatro Popular do Nordeste (TPN), sim, é o momento de maturidade artística de Hermilo, sobretudo o TPN da segunda fase, a partir de 1966. Ali, ele desenvolve encenações que estavam, de fato, na vanguarda da investigação teatral do país. O contexto político era muito tenso e complexo, propício a disputas, patrulhas e perseguições. Nos primeiros anos da década de 1960, em grande medida motivada por um desentendimento entre Hermilo e Germano Coelho, houve uma ríspida oposição entre o TPN e o teatro feito pelo MCP. Hermilo e Ariano, co-fundadores do MCP, logo rompem com esse movimento, afirmando não aceitar a instrumentalização política da arte. Após 1964, com a tomada de poder pelos militares, o TPN recebe ex-integrantes do MCP em seu elenco, e assume certo protagonismo na luta contra o autoritarismo e a repressão, encenando peças que claramente expressavam o posicionamento ideológico do grupo: Um inimigo do povo, de Ibsen; Andorra, de Max Frisch; Antígona, de Sófocles, O santo inquérito, de Dias Gomes, por exemplo. 



Hermilo Borba também foi crítico de teatro. De que forma essa sua produção escrita ajudou a analisar os espetáculos em cartaz na época e, ao mesmo tempo, mostrar um pouco do pensamento do autor?
Na década de 1940, o trabalho de Hermilo como crítico teatral foi muito importante, sobretudo por trazer ao Recife as grandes questões da modernidade teatral. Ali, também, podemos ver a formação e o fortalecimento de seus valores estéticos e éticos. Seu trabalho como crítico teatral em São Paulo, nos anos de 1950, é também decisivo para o aprimoramento e para a confirmação de suas ideias em busca de uma expressão teatral brasileira, nordestina.

Quais foram as contribuições estéticas que o teatro de Hermilo Borba Filho trouxe ao teatro brasileiro?
Desde jovem, ainda na década de 1940, Hermilo evidenciava alguns dos principais traços de sua personalidade como criador: intensidade e inquietação. Nos palcos, foi um pioneiro na discussão sobre a possibilidade de um teatro mais sintonizado com os valores e as questões próprias do Brasil, do Nordeste. Ávido por saber, importava livros que o mantinham atualizado com o que acontecia de mais importante na cena internacional. Foi um dos primeiros brasileiros a ler atentamente Brecht e Artaud, por exemplo. Colocava-se como seguidor de Copeau e como aliado de Vilar. Amava Lorca e O’Neill. Mas o seu interesse pelo teatro estrangeiro não era maior do que a sua admiração pelos artistas populares da terra. Viu poesia e beleza onde a maioria, quando muito, só enxergava “folclore”. Tinha como mestre o Capitão Antônio Pereira, do bumba-meu-boi da Mustardinha. Sem ser propriamente um discípulo de Gilberto Freyre, levou aos palcos a provocadora equação do Regionalismo de 1926: região, tradição e modernidade; abrindo, assim, caminho para algumas das melhores expressões do moderno teatro brasileiro.



Hermilo era um pensador arguto do teatro e escreveu vários livros, além de ter traduzido vários outros. Quais trabalhos nesse sentido você classifica como os mais relevantes?
Como pensador do teatro, Hermilo deixou muito material, refletindo sobre uma rica diversidade de temas, como: literatura dramática, encenação, interpretação e história do espetáculo. Em particular, de modo original, produziu estudos sobre as manifestações dramáticas do povo nordestino. Tenho o projeto de organizar uma publicação reunindo o melhor de seus ensaios, de suas palestras e de suas críticas teatrais. Nesse âmbito, considero  Diálogo do encenador, de 1964, como o título de maior relevo, pois se trata, no Brasil, de uma das primeiras investigações mais aprofundadas sobre a arte da encenação.



Você acha que a obra de Hermilo Borba Filho tem a importância devida a ela não apenas no Recife, mas fora daqui?
À medida que os estudos teatrais no país vão se desenvolvendo, nomes como o de Hermilo Borba Filho serão cada vez mais reconhecidos, por terem contribuído, entre outro aspectos, para que o teatro brasileiro, ao longo do século 20, ganhasse maior autonomia criativa, superando em grande medida um antigo sentimento de subalternidade (colonial), sobretudo em relação à cena europeia.