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sábado, 30 de dezembro de 2017

Zé Louzeiro em Capturas do Face por Antônio Torres


Aqui o Antonio Torres baiano se despede de Zé Louzeiro- maranhennse- 1932-2017. outra figura que deixa marca de falta profunda neste Brasil de tantos encantos e desencantos,e que fica um buraco duro,difícil de ser aterrado, por tantas crises, inclusive  de amizade e ternura, esta última já parece coisa do antigamente, que dó...o tempo não para pois nós não paramos como natureza em eterna ebulição.




Lá se foi mais um velho e bom camarada. Convivemos muito durante um longo tempo, sobretudo quando ele esteve à frente do Sindicato dos Escritores do Rio de Janeiro, e me levou para fazer parte da sua diretoria. Antes de tudo, Zé Louzeiro era um ser gregário, combativo e de ótima convivência. Fazem-lhe justiça as linhas escritas pelo "primo" Bolívar Torres, hoje, no Globo. Saudades. (Com Henrique Pires).

CARTA DE CAYMMI PARA JORGE AMADO ......CAPTURAS DO FACE VIA AMIGA REGINA GOMES via Claudio Passavante





A BAHIA de São Salvador  é sempre a  Bahia enorme que se espalha pelo país e mundo  com seu cheiro de brasilidade africana, e tudo  acompanhado de belezas, contradições , amizade, carinho. e cores .De Claudio Passavante para Regina Gomes para mim e para vocês.....Bom ano com esperanças de um tempo que seja ensopado  de amizades ,Paulo Vasconcelos.
Bahiatour


CARTA DE CAYMMI PARA JORGE AMADO
“Jorge, meu irmão, são onze e trinta da manhã e terminei de compor uma linda canção para Yemanjá, pois o reflexo do sol desenha seu manto em nosso mar, aqui na Pedra da Sereia. Quantas canções compus para Janaína, nem eu mesmo sei, é minha mãe, dela nasci.
Talvez Stela saiba, ela sabe tudo, que mulher, duas iguais não existem, que foi que eu fiz de bom para merecê-la? Ela te manda um beijo, outro para Zélia e eu morro de saudade de vocês.
Quando vierem, me tragam um pano africano para eu fazer uma túnica e ficar irresistível.
Ontem saí com Carybé, fomos buscar Camafeu na Rampa do Mercado, andamos por aí trocando pernas, sentindo os cheiros, tantos, um perfume de vida ao sol, vendo as cores, só de azuis contamos mais de quinze e havia um ocre na parede de uma casa, nem te digo. Então ao voltar, pintei um quadro, tão bonito, irmão, de causar inveja a Graciano. De inveja, Carybé quase morreu e Jenner, imagine!, se fartou de elogiar, te juro. Um quadro simples: uma baiana, o tabuleiro com abarás e acarajés e gente em volta.
Se eu tivesse tempo, ia ser pintor, ganhava uma fortuna. O que me falta é tempo para pintar, compor vou compondo devagar e sempre, tu sabes como é, música com pressa é aquela droga que tem às pampas sobrando por aí. O tempo que tenho mal chega para viver: visitar Dona Menininha, saudar Xangô, conversar com Mirabeau, me aconselhar com Celestino sobre como investir o dinheiro que não tenho e nunca terei, graças a Deus, ouvir Carybé mentir, andar nas ruas, olhar o mar, não fazer nada e tantas outras obrigações que me ocupam o dia inteiro. Cadê tempo pra pintar?
Quero te dizer uma coisa que já te disse uma vez, há mais de vinte anos quando te deu de viver na Europa e nunca mais voltavas: a Bahia está viva, ainda lá, cada dia mais bonita, o firmamento azul, esse mar tão verde e o povaréu. Por falar nisso, Stela de Oxóssi é a nova iyalorixá do Axé e, na festa da consagração, ikedes e iaôs, todos na roça perguntavam onde anda Obá Arolu que não veio ver sua irmã subir ao trono de rainha?
Pois ontem, às quatro da tarde, um pouco mais ou menos, saí com Carybé e Camafeu a te procurar e não te encontrando, indagamos: que faz ele que não está aqui se aqui é seu lugar? A lua de Londres, já dizia um poeta lusitano que li numa antologia de meu tempo de menino, é merencória. A daqui é aquela lua. Por que foi ele para a Inglaterra? Não é inglês, nem nada, que faz em Londres? Um bom filho-da-puta é o que ele é, nosso irmãozinho.
Sabes que vendi a casa da Pedra da Sereia? Pois vendi. Fizeram um edifício medonho bem em cima dela e anunciaram nos jornais: venha ser vizinho de Dorival Caymmi. Então fiquei retado e vendi a casa, comprei um apartamento na Pituba, vou ser vizinho de James e de João Ubaldo, daquelas duas ‘línguas viperinas, veja que irresponsabilidade a minha.
Mas hoje, antes de me mudar, fiz essa canção para Yemanjá que fala em peixe e em vento, em saveiro e no mestre do saveiro, no mar da Bahia. Nunca soube falar de outras coisas. Dessas e de mulher. Dora, Marina, Adalgisa, Anália, Rosa morena, como vais morena Rosa, quantas outras e todas, como sabes, são a minha Stela com quem um dia me casei te tendo de padrinho.
A bênção, meu padrinho, Oxóssi te proteja nessas inglaterras, um beijo para Zélia, não esqueçam de trazer meu pano africano, volte logo, tua casa é aqui e eu sou teu irmão Caymmi”.

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Se 2018 também vai virar sucata, não acharemos nele o novo que desejamos -Elton Luiz L. de Souza - Captura do Face


O professor, Filósofo e poeta nos diz bem simples o que estamos a viver,saindo de um conceito para outro  ou para um mesmo, o tempo é assim, a vida e assim que digam, falem os poetas um dentro da boca do outro, um falando para o outro e os outros, nós ,a ouvir.Um ano que sai e outro que segue..Paulo Vasconcelos

“O que é verdadeiramente novo nunca vira sucata” , ensina o poeta Manoel de Barros. “Sucata”, segundo o poeta, é tudo aquilo que a “velhez venceu”. “Velhez” não é uma vida perto do fim , velhez é uma vida que se perdeu de seu começo, de seu “minadouro”, de sua (re)invenção.
Se 2017 está virando sucata, não era ele verdadeiramente o tempo novo. Se 2018 também vai virar sucata, não acharemos nele o novo que desejamos . Mas onde achar a “não velhez” do tempo, o seu embrião?

Sem fazer alarde ou promessas, independente de tecnologias, a aurora de não importa qual dia nos dá a resposta, sem exigir champanhe ou fogos em troca: uma aurora sempre vem para nos lembrar que todo dia é dia novo! ( e não apenas 1º de janeiro!)

“Durante as viagens sem rumo dos andarilhos
eles são instalados na natureza igual se fossem uma aurora”.
( Manoel de Barros)
“Erguer-se... como se ergue
a aurora do seio da noite”.
(Homero, Ilíada )
Elton Luiz Leite de Souza-RF
Prof Uerj Rj

domingo, 24 de dezembro de 2017

NATAL SEM GOLPE, SEM FOME..O Nordeste espera um Cristo, espera o rei da esperança que traga a espada e o pão.

NATAL SEM GOLPE, SEM FOME ,SEM INFÂMIA...FORA TEMER E SUA TRUPE




É preciso da as mãos e sair às ruas, é preciso expulsar este governo.A dignidade há de se ter sem ou com pancadaria, a paz não é feita só de branco, mas de sangue, de luta, de união dos que acreditam em uma democracia dos homens de boa vontade. É preciso ensaiar e estrear a luta nas ruas , cidades, campos e igreja.A paz não se recebe de mãos limpas, de cristianismo barato, a paz é de fogo, fé e pé no chão, espada  e grito.
Como disse o poeta Ledo Ivo em O Alagoano: pag 732 Poesia completa


O Nordeste espera um Cristo,
espera o rei da esperança
que traga a espada e o pão.

....
O Nordeste espera um rei como Dom Sebastião
que venha com seu chicote,
flor de fogo em sua mão,
castigar quem mata o povo
e condenar o  ladrão
que desde que  vida é vida
rouba tudo quanto temos,
a terra que Deus nos eu
quando dividiu o mundo
entre os viventes,
a roupa  do nosso corpo
o milho da plantação,
nossa mandioca branca
e o leite de nossas  cabras
as águas de nossa sede,
o charque de nossa fome
e os frutos do nosso ventre.
O nordeste espera um Cristo
que não morra numa cruz
como o menino Jesus
ou não seja esqurtejado
como o Major Calabar
mas que, salvo pelo povo,
da sanha dos fariseus,
viva sempre ao nosso lado
rei e monarca do mundo
com  seu reinado de luz.
Que venha um deus -guerrilheiro
ser o nosso capitão,
corrigir as injustiças,libertar-nos da miséria
e fundar na nossa terra
A monarquia do pão

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Pernambucana vence disputa nacional de poesia e vai para etapa mundial em Paris

Interessante matéria do Diário de Pernambuco. A poesia como crítica social....vale a pena...
http://bit.ly/2kKA6AU




Isabella Puente versou sobre racismo, machismo e a 'identidade nordestina', destacando os preconceitos http://bit.ly/2kKA6AU
Da última quinta-feira (14) até domingo (17), Isabella e poetas de diversos lugares do Brasil se apresentaram no Sesc Pinheiros. A competição consiste na performance de textos autorais de até três minutos, que podem discorrer sobre temas variados, com inspiração na prática batizada de slam poetry que surgiu na década de 1980 em Chicago, nos Estados Unidos, em um movimento encabeçado por Marc Smith. Dentre temas como machismo, racismo, a ideia de depredação do patrimônio público e o adoecimento psicológico de jovens em decorrência da pressão da sociedade capitalistas, a pernambucana versou a respeito do e a identidade nordestina, com destaque para o próprio estado. 

"Nordeste tem nove estados, nem vem dizer que não sabia. Sul e Sudeste têm IDH foda, mas não tem aula de geografia. De onde eu venho, nós 'fala' 'oxe, eita carai, misericórdia, minha fia'. Ataque. Ator de novela quando imita nosso sotaque. É que pra vocês, nós somos caricatura. Não importa de onde eu venho, me chamam de "paraíba". Me respeita, boy. Sou da terra de Capiba! Mestre Vitalino, Paulo Freire, Manoel Bandeira, brega, frevo, coco de roda, maracatu, cultura popular pulsante!", recita Isabella em uma das apresentações, que, postada pela irmã no Facebook, se tornou viral. 

Ela explica que tem família carioca por parte de mãe e sempre sentiu na pele o preconceito por ser nordestina. "Como boa pernambucana, sou bairrista e comecei a refletir sobre questões que eu não via nos slams, que era essa relação do Nordeste com o Sudeste. Minha família do Rio de Janeiro é pobre e, mesmo sendo classe média no Recife, as pessoas de lá se sentiam melhores do que a gente, nos chamando de 'paraíba'", reflete, citando que, todo o Norte - cerca de 45,25% do território nacional - estava representado por apenas uma pessoa, enquanto cinco paulistas competiam na disputa. 

Com o título nacional, Isabella agora dividirá o tempo entre a dissertação do mestrado e a observação da competição internacional, que ela enfrentará em Paris em maio do ano que vem. Assim como ocorreu para a viagem a São Paulo, deve receber apoio para custear a viagem. "Preciso estudar e ver vídeos do que os artistas de outros países fazem por lá. "É uma felicidade muito grande por todo o compromisso e dedicação, estou muito feliz por ser de Pernambuco e do Nordeste", comemora. 

Vide Link http://bit.ly/2kKA6AU

AINDA SOBRE O DESMONTE DA EDUCAÇÃO PÚBLICA...captura do Facebook

A educação como todo entra em exato desmonte e agora com foco nas universidades Públicas.As Universidades privadas criaram um modelo neo-liberal de Educação, desde os anos 90 com FHC e agora serve de modelo para a derrubada das Universidades Públicas.Fui e sou testemunha disso;Luis Felipe Miguel aqui fala e capturei  tal e qual pelo Face. Paulo Vasconcelos
Foto Unesp

“O que se delineia, no Brasil hoje, é a destruição completa do ensino superior e da pesquisa científica.
As instituições privadas aproveitaram a derrubada dos direitos trabalhistas para promover demissões em massa e substituir profissionais experientes por professores temporários e sub-remunerados. Além do drama pessoal de tantos colegas, que perderam o emprego por vezes depois de décadas de trabalho, afirma-se a opção preferencial das universidade privadas brasileiras por serem fábricas de diplomas, sem qualquer preocupação com a qualidade do ensino e muito menos com a pesquisa.
As instituições estaduais vivem, em graus diferentes, situações dramáticas. O caso mais grave é o da UERJ, vítima de um sufocamento criminoso, mas outras universidades importantes, como as de São Paulo ou do Paraná, sofrem com a redução de seus orçamentos e o desinteresse, quando não hostilidade, dos governos, com impactos já sensíveis nas condições de trabalho.
As universidades federais vivenciam o recrudescimentos dos ataques que sofrem há décadas, com o objetivo de abolir a gratuidade e abrir caminho para a privatização, do qual o melhor exemplo é o infame relatório do Banco Mundial. Vivemos também um novo ciclo de subfinanciamento, com consequências também já visíveis. A "novidade" é o cerco judiciário-policial-midiático, sob pretextos o mais das vezes risíveis, com o objetivo de humilhar e intimidar seus dirigentes e desmoralizar sua imagem pública.
Acrescente-se ao cenário a ofensiva censória da extrema-direita, contra o pensamento crítico praticado nos campi.
O que está em jogo é mais do que a universidade. É o futuro do Brasil; é a possibilidade de se construir um país mais justo, mais desenvolvido e mais soberano, um projeto que não prescinde da educação e da ciência”.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

O MAR SOU EU .....ADRIANE GARCIA

acervo da autora 
 
acervo da autora


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Nada diz o poeta senão apregoar uma falta e assim envergar um mundo, fabulando para ser real e assim pintando-o de cor de água, e deste modo eles: “trafegam a água, de cá para lá, de lá para cá, no constante de carregar o mundo”, como se assim possível fosse. Mas o que não pode o poeta, esse sujeito que mesmo delirante sobre a palavra assumidamente, diz com seu olho cego o que o cerca?

Adriane Garcia é um polvo, um dourado de nadadeiras amplas de Belo Horizonte/MG, formada em História, Teatro e Arte-educação. Colabora no site Escritoras Suicidas, Zona da Palavra e Literaturabr. Já publicou no Rascunho, Germina, Eutomia, Vox, Cult, Vida Secreta, Vossa Senhoria e no caderno Pensar do Jornal Estado de Minas. Em 2013 venceu o concurso nacional de literatura do Paraná, Helena Kolody, categoria poesia, com o livro “Fábulas para adulto perder o sono”, com segunda edição pela editora Confraria do Vento (2017). Em 2014, publicou “O nome do mundo”, pela editora Armazém da Cultura e em 2015, “Só, com peixes”, pela Confraria do Vento. Em 2016 participou da Coleção Leve um Livro, com “Embrulhado para viagem”. Tem online, pela Revista Vida Secreta, o e-book “Enlouquecer é ganhar mil pássaros”. Participa de diversas antologias. Foi curadora do Festival Literário Internacional de Belo Horizonte, 2017.

Pelo seu perfil vemos uma nadadeira entre pedras, sem linhas, mas como a mesma diz: com espinha, a espinha do poeta que fala entre as águas e mares de palavras e não importa a geolocalização, importa ser e para tanto dizer, e assim se faz, se erige numa coluna armada estilística e constrói essa coisa chamada literatura, ou melhor, a arte.

Não apodrecemos mais rápido pela ilusão, pela arte, por esta ressureição que essa coisa nos faz pulular, e assim Adriane é vasta, numa linha curva que perpassa a história, o teatro, a educação como arte educadora e fabula na letra e outras linguagens, o que para nós é de extremo ganho.

A loucura da poesia é assumir nossa carapaça de sujeitos desnorteados e nessa gagueira aliviar-se, ser, virar coisas como peixes, escada, língua de água, o transmutar-se em outros para olhar, ver, sentir, ser peixe, escada, língua etc. ver sendo e não sendo. Ou seja, ser útil sem rezar no desmanche dos objetos da religião do consumo, a literatura se presta a isto ao menos, e este é o maior dos capitais: ser dizendo, pensar, criar, sem a não verdadeira calda do humano que o capitalismo que nos afoga. Poesia é o desmantelo para crer. O peixe é meu, é seu, ponho no ombro, na esquina, na cédula e desdigo o falso real, ou melhor, o contradigo para poetar.
Só com peixes (2015), Adriane encontra a desculpa esmolambada e rica de ser e dizer do amor, do líquido, do concreto, até chegar a uma cauda poética, como aqui vemos:

Se o canto funcionasse/E o homem descesse a escada/Se o amor não se afogasse/Nem ficasse pintado de azul/Não seria a sereia rouca/Arrancando as escamas /Dacauda.
(2015, p.44)


Adriane Garcia faz rupturas indeléveis; na sua lírica, ela doma a palavra, tira seu pavio e o acende naquilo que digo ser uma poeisis desmedida e séria, desloca sentidos, faz piruetas, expatria o primeiro sentido do signo imprestável e o pinta de outras cores:

“Há dias uma ordem interior manda/Que ela vá ao aquário/Conversar com peixes/A sua língua de água/seu corpo lixa de areia (2015, p.450)
ou
a saudade do sal não se repara/Com a imersão difícil/Nesse oxigênio sujo”
(2015, p.69)

Mas fizemos uma palavra/palavra, em que podemos sentir um pouco mais a poeta, ou seja, cheirar seus sais de pensamentos e eis aqui alguns dos trechos:

Arte educadora, e como foi isso?

Eu já trabalhava como voluntária em escolas públicas, dando aulas de iniciação teatral para adolescentes. Ao mesmo tempo, concluía minha graduação em História, pela UFMG. Ficava muito dividida (mas talvez a palavra certa seja “complementada”) entre a História e o Teatro, e isso acabou definindo minha vontade de fazer pós-graduação em arte-educação. O mais interessante é que, no fim das contas (risos), eu acabei fazendo um trabalho de conclusão de curso ligado à desmemória da história da cidade.


A história, o teatro e o ensino da arte....

Exatamente. É para mim um trânsito, um trânsito complementar. Ensinar teatro para adolescentes da escola pública (fiquei cerca de 10 anos nesse trabalho), ou para deficientes visuais na escola pública (passei um ano trabalhando no Instituto São Rafael), era não só ensinar/aprender arte, mas saber o que socialmente, historicamente, significava contribuir de alguma forma para que a educação tivesse mais qualidade, mais diversidade, que a arte se estabelecesse como um direito, sempre. Ao mesmo tempo, aprender, ler história e ter contato com a dramaturgia permitiam não só que eu me tornasse cidadã mais consciente como, ao mesmo tempo, me tornasse mais capacitada como oficineira de teatro. É um trânsito com o qual eu me sinto privilegiada por poder exercer. Hoje, não pratico mais essas oficinas, mas faço esse trânsito por meio de leituras, e somo isso com a filosofia, com a literatura; principalmente com a poesia.

A poesia e o salpicar do humano...

A poesia me surpreende todos os dias. Quando conheço um poeta antigo que ainda não conhecia, a poesia me surpreende. Quando conheço um poeta novo, cujo poema move algo em mim, me surpreendo. Recentemente, fui curadora do FLIBH (juntamente com Francisco de Morais Mendes) e um dos saraus que se apresentaram foi o Sarau das Manas (coletivo de meninas adolescentes da região periférica de BH). Uma delas leu um poema autoral onde descrevia, de dentro, a vida de uma mulher presidiária. Eu me surpreendi. A poesia me surpreende porque acorda algo em mim, vive me acordando. A poesia me humaniza.

A Filosofia e teus preferidos

Nietzsche porque me fez ter medo de lê-lo. Ajudou-me numa desconstrução importante. Eu fui criada com coisas muito católicas, minha avó me levou a catecismo e, apesar de ser sempre questionadora, obviamente, coisas muito ruins ligadas ao Cristianismo estavam em mim. Ler Nietzsche me libertou de muitas coisas, me deu medo e depois coragem. Eu vi que pensar não era pecado (risos), que pecado nem existia.

Spinoza porque me enlouqueceu. Achei aquilo tudo muito destruidor, sabe? Muito parecido com outras concepções de universo e até de Deus. Tão mais aproximado do Budismo, ou do Hinduísmo, não cabia mais ali um deus à imagem e semelhança do homem. E a sua ideia dos afetos, eu achei aquilo tão parecido com a poesia, bebendo do mesmo mistério. Aliás, o próprio Spinoza me pareceu um personagem da poesia, imaginar que esse homem excomungado pela igreja judaica fazia lentes para se enxergar melhor. Pensar que ele faz isso até hoje.



A poesia e teus eleitos

Ah, meus eleitos. Primeiro Cecília, porque foi dela o primeiro livro de poesia que peguei na vida (Ou isto ou aquilo). Depois Drummond, ele esteve comigo por toda a minha adolescência e me acompanha para sempre, salvou-me de uma imensa solidão (eu não nasci numa família letrada, nem tínhamos livros, portanto não tinha muita escuta para o que eu descobria com a literatura ou para as indagações que surgiam dali. Até lia para minha mãe poemas dos livros que me emprestavam na biblioteca escolar, mas estava todo mundo muito ocupado, sobrevivendo e cuidando para que os filhos sobrevivessem às condições muito difíceis).

Mas eu poderia citar muitas e muitos poetas. Há várias e vários poetas contemporâneos que admiro hoje (vivos). E tem-me encantado bastante a poesia falada, a poesia que é feita pelos excluídos de nossa sociedade.




Poesia política e contemporaneidade-

Tem um poeta contemporâneo que eu creio que, de alguma forma, me influenciou muito recentemente. Há uns cinco anos que conheço sua poesia. É Alberto Lins Caldas, nascido em Gravatá, Pernambuco. Acho que foi Lins quem me chamou a atenção mais imediata para o fato de que é estranho uma poesia recatada e do lar em tempos como estes. A poesia de Lins é feita de beleza, mas sobretudo de combate. Alia um conhecimento histórico, filosófico imensos a um discurso rebelde, revolucionário. Lins escreve sem compaixão (e talvez por uma compaixão extrema). Essas coisas todas vão nos transformando, não é? Estar no mundo, sobretudo ouvir. Agora quero ouvir, quero ouvir o que não sei e de onde eu não sei. Quem tem feito uma poesia política vigorosa no país são os poetas anônimos, que moram nas periferias das tantas cidades. Em livros, tenho visto poetas muito boas tratando de temas urgentes, cito aqui (sempre fazendo injustiça, pois há mais) a poeta carioca Bruna Mitrano, que levanta questões sobre mulher, violência e aborto; a poeta mineira Lisa Alves, cujos poemas dialogam com a política no Brasil e no mundo; a poeta mineira Simone Teodoro também tem desenvolvido um trabalho muito bom em relação ao feminismo, à homofobia, aos excluídos da cidade, que vivem aparecendo em seus poemas; Simone de Andrade Neves acabou de escrever um “Missa do envio”, no qual olha para a festa do divino e trabalha, no presente, uma tradição rural mineira; Ricardo Aleixo lançou recentemente “O antiboi”, livro que discute política, racismo. Claro que não quero, com isso, dizer que não sinto um prazer imenso em ler poesia com outras temáticas, temáticas introspectivas, inclusive. Há tanta beleza e universalismo nisso, mas ultimamente, a poesia solidária tem me chamado mais atenção do que a solitária.

....
Só com Adriane, com peixes,não , queremos mais, mais e mais caldos de sua poesia de uma mulher madura e que sabe tanger a lírica como um maestro de montanhas, mas podera, ela vem de lá, das cadeias de planaltos inclinados a peixe, mas como ela mesmo disse ao telefone avilta a fala dos cardumes.




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quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

O VELÓRIO DE JORGE AMADO OU JORGE BERRO D’ÁGUA….Capturas do face

Temos que ler os vários lado da história, ainda mais dito por um nome da literatura brasileira e que reverbera fora do Brasil,  vamos ler...Paulo Vasconcelos
Narlan Matos ...acervo do autor

O VELÓRIO DE JORGE AMADO OU JORGE BERRO D’ÁGUA….
Por Narlan Matos*


Anunciaram, por fim, o falecimento do grande mestre Jorge Amado.

Eu já vinha acompanhando tudo, triste, via TV e jornais há semanas. E seu funeral estava ali, justamente naquele dia, na véspera de uma tenebrosa prova final de Morfossintaxe, no Instituto de Letras da UFBA, onde estava para me formar, em 2001. Olhei a quantidade de livros para estudar e a foto do mestre querido no jornal. Pensei… Eu já vinha estudando há semanas para enfrentar a assustadora prova, mas quem já estudou Morfossintaxe sabe bem do que estou falando. Precisava de mais um dia, pelo menos, para me sentir menos inseguro. Olhava a foto sorridente do mestre. Seu sorriso tímido e terno. 

Havia trabalhado, por vários anos, organizando os discursos políticos de Jorge Amado, quando fora deputado federal, em 1946, sob a orientação da Dra. Ana Rosa Ramos, doutorada pela Sorbonne e uma das maiores especialistas no Amado do Brasil. Ana me ensinou como o resto do mundo vê Jorge Amado, sobretudo os franceses e russos. Era como perder o funeral de Mark Twain ou Charles Dickens. Me arrumei e fui. “A prova que espere”, pensei. No rádio anunciaram que o funeral seria no Palácio da Aclamação, perto do Campo Grande. No caminho, ia caminhando triste e cabisbaixo.

Olhava os ultimos dos casarões antigos da Vitória, comentado por ele em seus livros. Sabia do tamanho daquela perda, não para a Bahia, mais para o mundo. Jorge Amado, ali, não era um autor brasileiro, mas um homem que, no distante Leste Europeu – e em todos os países comunistas - , faziam-se filas quilométricas para comprarem seus livros. O autor estrangeiro mais bem pago no selvagem mercado editorial dos USA. 

Caminhava e pensava em tudo que Ana havia me ensinado e que eu mesmo descobrira nos anos em que pesquisei sua obra, como bolsista do CNPQ. Eu o havia encontrado apenas uma vez de perto, no Museu Carlos Costa Pinto, quando do curso sobre a culinária de Dona Flor, organizado pela poeta e amiga Myriam Fraga. Nunca vou esquecer aquele momento. Eu estava no auditório do Museu, um dos primeiros, lá na frente. De repente, Myriam parou o curso e falou “Jorge Amado já está aquí”. Me virei de súbito e o vi, sentado, na última fila, com aquela cabeleira vasta e branca como uma nuvem, grande, sob a qual um par de olhos muito, muito vivos se moviam. Parecia mais um menino no corpo de um velho. 

Durante todo aquele evento, nunca tive nem tempo e nem a coragem para ir lá falar com ele. Tinha sempre alguém ao redor. Dona Zélia, sempre. 
Até que, já no final – porque e usó saí dali no cisco - ele veio vindo, veio vindo, na minha direção. Passaram quase raspando em meu braço directo ele e dona Zélia. Passaram sorrindo e sorriram para mim, olhando-me nos olhos. Eu não me contentei e dei-lhe um tapinha no ombro esquerdo. Que simpatia! Havia tocado em Jorge Amado! Era ele, um herói do Brasil. Preso tantas e tantas vezes. Exilado tantas vezes. Era ele! O que tinha escrito Tenda dos Milagres, transformado em série pela Globo, em 1985, e eu, fascinado, com apenas dez anos de idade, ficava acordado até terminar, tarde da noite, nas frias noites da subestação da COELBA onde nós morávamos, em Itaquara. O tema de abertura, de Caetano Veloso, era tão lindo quanto o romance. 

Caminhava e pensava em tudo isso. 

Cheguei triste ao palácio. Dois guardas estavam de prontidão na gigantesca porta principal, ambos com armas. A entrada era controlada pois já era noite. Será que eu não conseguiria entrar? Encontrei com meu amigo Carlos Pronzato, o lendário cineasta argentino. Não caçamos conversa – entramos sem pedir licença. Lá dentro, ainda poucas pessoas. E vi o caixão. Me aproximei, triste. De repente, vi o rosto de Jorge Amado. Parecia estar dormindo. Sereno. No rosto, o mesmo sorriso que havia sorrido para mim no Museu Carlos Costa Pinto. Foi aí que minha tristeza foi se convertendo, pouco a pouco, numa extranha alegria: lembrei que Jorge Amado era um verdadeiro mestre dos funerais em seus romances e ali estava ele, no seu próprio, com um sorriso no rosto que lembrava Quincas Berro D’Água! Olhei pela janela do palácio e vi a lua cheia, grande, branca, no céu azul, brilhando por entre as gigantescas palmeiras. 

Uma noite calma. De repente, ao meu lado, chegaram dois políticos, de terno e gravata, e começaram a fingir que choravam! Choravam e soltavam frases de efeito. “Ele era um mestre”, bradavam. Me aproximei. Puxei conversa. “O que vocês acham da literatura dele?”, perguntei. “Ele era um mestre”, bradaram sem me responder, olhando o caixão. A partir daí, eu fazia um esforço cada vez maior para não cair na gargalhada. O funeral de Jorge Amado começou a ser converter numa página escrita por ele mesmo. E, de repente, encheu. 

Chegaram madames, socialites, escritores, poetas, professores, acadêmicos – tudo que ele adorava em seus funerais! Um burburinho imenso se fez, parecia uma feira. Algumas madames, ao meu lado, usando óculos escuros, à noite, cenograficamente, limpavam as lágrimas e os óculos – embaçados pelo frígido choro. Começaram a servir bebidas e petiscos finos. Uma pequena gang de poetas do submundo se aproximava dos garçons e o cercavam educadamente. As frases eruditas, elegantes, piegas, ouviam-se, e todo tipo de vocabulário que só me lembrava os funerais de Amado. Um poeta, conhecido, recitava versos célebres, já cheio de cachaça. 

Ouvi pessoas falando em espanhol, francês. E a pequena gang de poetas do submundo cercava os garçons, educadamente. De repente, todos pararam: uma atriz bastante famosa adentrou, lentamente, o salão. Uma entrada triunfal que parou o funeral. Veio caminhando lenta, com flores nas mãos. Chorava intensamente mas, ao adentrar o enorme salão, se contuve., amparada pelo irmão. Chegou até o caixão, depositou as flores, e ficou lá por quase meia hora, conversando com Jorge. 

Ao redor, todos os tipos de cenas acontecendo. À essa altura eu sorria e sorria. Nunca pensei que, em minha vida, seria, um dia, mais um personagem no funeral de Jorge Amado. Jorge, no meio de tudo, sorria, continuava com seu sorriso tímido no rosto sereno, como se, ele mesmo, estivesse se divertindo ao máximo em seu último velório. Parecia que queria sair, como Quincas, pelas ruas da Bahia, pela última vez… Eu tive vontade de tira-lo do caixão e conduzi-lo pelas ruas da Bahia pela última vez, pelos submundos que ele eternizou. 

A lua da Bahia continuava brilhando no céu, cheia, branca, e as palmeiras imensas balançavam ao vento da noite quente e tropical. Tarde da noite, voltei para casa, sorrindo…afinal, nunca havia pensado que seria o menino de Itaquara iria estar presente ao funeral do grande mestre, aquele menino que adorava Jorge Amado; aquele que ficava acordado até tarde, aos 10 anos de idade, nas frias noites de Itaquara, para assistir Tenda dos Milagres e ficava fascinado com as igrejas do Pelourinho, de Salvador, com o povo africano; aquele menino que se tornaria, um dia, poeta, e iria pelo mundo, para o Leste Europeu, recitando versos vindos da Bahia. O menino de Itaquara, um dia, teria seu primeiro livro de poemas publicado justamente pela Fundação Casa de Jorge Amado e receberia, também, uma carta de Jorge saudando-o pela estréia.
O menino de Itaquara escreveria, um dia, seu testemunho da hilária – invisível - estória do velório de Jorge Amado…

Narlan Matos Teixeira nasceu em Itaquara, Bahia, a 15 de Julho de 1975. Bacharel em Letras pela Universidade Federal da Bahia e Mestre em Artes, pela Universidade do Novo México, e Ph.D pela University of Illinois at Urbana Champaign, nos Estados Unidos, onde também lecionou...vide..http://www.elfikurten.com.br/2016/02/narlan-matos.html

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

QUEM É UM COXINHA? (OU: VAI PRA CUBA!) ROBERTO NUMERIANO -RECIFE capturas do face


QUEM É UM COXINHA? (OU: VAI PRA CUBA!)
Não sei quem inventou esse apelido perfeito. Daqueles que "pegam", pois o sujeito ou a sujeita "pega um ar" toda vez que alguém lhe aponta nas ruas e diz" "Sai pra lá, coxinha"... Mas, afinal, o que é ou quem é um coxinha? Pelo que pude reunir nestes quase dois anos que conheço a palavra, um coxinha carrega um monte de significados, normalmente reunidos numa pessoa pelo fato de que o ser coxinha é uma condição sociológica, político-ideológica e filosófica. Em geral, é um tipo ideologicamente reaça, com pretensões de perfeito cidadão "pagador de impostos". Suas palavras e atos são conservadoramente previsíveis, desde o sorrizinho social no elevador ao comentário reacionário sobre as agendas sociais de esquerda. Um coxinha é quase sempre hipócrita: grita publicamente contra a corrupção dos políticos, mas comete contravenções cotidianas e crimes continuados: reveste os vidros do carro com película numa porcentagem ilegal (os mesmos carros com adesivos de "Tchau, querida") ou, toda vez que pode, sonega recolhimento de impostos à Receita Federal (alegando "carga tributária extorsiva"). Um coxinha também se mete a bom cristão. Adora aplacar seu egoísmo social fazendo caridade de quermesse, embora, no dia a dia, olhe atravessado para os pobres e miseráveis que sobrevivem nas ruas e ficam esmolando. O coxinha gosta de cuidar do corpo e de contar futilidades típicas de viagens ao exterior. Gasta muitas horas de academia por semana e adora se olhar narcisicamente nos espelhos (quase num gozo masturbatório com a própria imagem), lê pouco ou nada de assuntos culturais (literatura ou ensaios culturais, nem pensar), faz do carro comprado em trocentas vezes templo e altar do seu "sucesso" e realização pessoal, conversa sempre com as verdades prontas da ideologia do "Deus mercado", se diz gente praticante de alguma religião (mas desconhece o que é religiosidade), vive a detonar os servidores públicos (até um dos seus filhos passar num concurso e entrar numa carreira), acredita que a universidade pública deveria ser privatizada (porque, é claro, seus filhos poderão pagar), não sabe o que é socialismo ou comunismo (mas é capaz de babar de ódio por horas "falando" desses assuntos), e, em geral, é misógino (tem aversão às mulheres), homofóbico, racista, além de fatal eleitor de Bolsonaro. Por fim, quando alguns argumentos básicos desmontam suas ideias tolas e sem base sobre questões ideológicas, sociais, culturais e políticas, ele incha igual um sapo cururu e diz: "Vai pra Cuba".
Bom dia, aquele abraço, saúde e paz.
Recife/PE, 30/11/2017
PS: Boa notícia: o meu projeto de publicação do ensaio "Gilberto Freyre: Imaginários da Casa-Grande à Favela", foi selecionado pelo Funcultura / Fundarpe. O livro já está pronto. Ano que vem será lançado.

* Doutor em Ciência Política, jornalista, militante do PSOL e pesquisador do Núcleo de Estudos de Instituições Coercitivas e da Criminalidade da Univeridade Federal do Pernanbuco (NICC/UFPE).