Texto: Vinícius Aleixo de Lim
Há cerca de duas semanas, o grupo Diálogos Insubmissos de Mulheres
Negras lançou uma campanha virtual pela indicação da 
escritora afro-brasileira Conceição Evaristo à cadeira 7 da Academia
 Brasileira de Letras (ABL), que está vaga desde a morte do 
cineasta Nelson Pereira dos Santos, em 21 de abril deste ano. 
O abaixo-assinado já reune até o momento mais de 16 mil 
assinaturas. Caso a mobilização seja vitoriosa, Evaristoserá a primeira 
mulher negra a integrar a ABL.
Nascida numa favela de Belo Horizonte em 1946, a hoje doutora 
em Letras pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e vencedora 
de um Prêmio Jabuti (2015) caracteriza sua trajetória como uma 
história de exceção, às quais afirma que “devem ser lidas para 
se pensar a regra”. A regra, no caso, é a marginalização dos 
negros na literatura brasileira, que Evaristopôde superar com 
um reconhecimento que só lhe foi devidamente concedido já em 
avançada idade.
Sua escola literária é própria, que ela mesma denomina de 
escrevivência, na qual o texto literário nasce a partir das suas 
vivências particulares enquanto mulher negra, conferindo profundidade,
 personalidade, e verossimilhança às suas personagens, especialmente quando 
comparadas a personagens negras construídas por autores brancos ao longo da 
história literária nacional, estas, geralmente constituídas a partir de estereótipos 
racistas, como a hipersexualização e a subserviência. Segundo Evaristo
“a escrevivência não é para adormecer os da Casa Grande e sim 
para acordá-los 
dos seus sonhos injustos”.
A primeira publicação literária da escritora, uma coletânea de poemas, ocorreu nos anos
 90 nos Cadernos Negros, organizada pelo coletivo Quilombhoje. Após esta, a próxima 
ocorreria apenas em 2003, com o romance Ponciá Vivêncio, que a alçaria, com o tempo, 
à condição de imprescindível autora da literatura brasileira contemporânea. Depois, 
vieram o romance Becos da Memória (2006), a coletânea Poemas da Recordação e 
Outros Movimentos(2008), os contos Insubmissas Lágrimas de Mulheres (2011), 
os premiados contos de Olhos D’Água (2014), e sua última publicação, Histórias de Leves
 Enganos e Parecenças (2016).
Sobre a campanha em defesa de sua indicação para a ABL, em entrevista ao portal Sul21, 

Evaristo afirma que “se a academia brasileira é um lugar, uma instituição de representação 
de uma nacionalidade literária, então, estou com vontade de me candidatar mesmo e vamos ver”.
A Academia e a negritude
Segundo o estatuto fundacional da ABL, seu papel é o de cultuar a língua e a literatura nacional, 
atuando como uma espécie de guardiã da literatura brasileira. Num país de maioria negra 
incrustado por um racismo (no passado e no presente) que violenta, marginaliza, e invisibiliza, 
é imperativa a necessidade de representação adequada dos negros em espaços de poder,
 culturais, e acadêmicos, incluindo-se aí, a própria ABL. Historicamente, porém, a representatividade 
da população afro-brasileira também não é proporcional na Academia à profusão de grandes autores.
Fundada em 1897 com um escritor negro ocupando a primeira presidência — a saber, Machado 
de Assis —, a Academia Brasileira de Letras em seus 120 anos de história consagrou mais 
de 280 personalidades à imortalidade das Letras, entretanto, dentre estes, o número de 
negros selecionados não chega a dez — além de Assis, contamos José do Patrocínio,
 Domício Proença Filho, Dom Lucas Moreira Neves e Dom Silvério Lucas Pimenta —
, e o de negras é zero. Até mesmo autoras e autores negros que conquistaram grande 
prestígio na literatura nacional, como Lima Barreto, Maria Firmina dos Reis, Solano Trindade e
 Carolina Maria de Jesus ficaram de fora do seleto grupo de imortais.
Na ocasião da vacância da cadeira 29. após a morte do bibliófilo José Mindlin. em 2010, 
o escritor, cantor e compositor Martinho da Vila se candidatou à ocupação da 
vaga, entretanto, não recebeu nenhum voto favorável dosmembros da Academia.
Literatura negra brasileira
Apesar das dificuldades enfrentadas pelos autores negros para conseguirem publicar e 
obter reconhecimento público por suas obras, a produção literária afro-brasileira, especialmente
 nas últimas décadas, se mostra cada vez mais rica e pujante. Ainda que o maior número 
de publicações de autores desta população se localize na contemporaneidade, ao menos 
desde o século XIX podemos encontrar grandes literatos que obtiveram o devido reconhecimento 
por suas produções, como Cruz e Souza (1861-1898), José do Patrocínio (1853-1905),
Lima Barreto (1881-1922), Machado de Assis (1839-1908), Castro Alves (1847-1871) e Maria Firmina
 dos Reis (1825-1917).
Buscando contornar o preterimento da autoria negra, entrave muito presente nas grande
editoras no momento de selecionarem obras a serem publicadas, nas últimas décadas 
começaram a surgir no Brasil selos cujo foco é justamente a publicação de obras produzidas 
por autores afro-brasileiros, potencializando o alcance e a visibilidade destes artistas. 
Entre as iniciativas, para citar algumas, destacamos as editoras Mazza Edições, Editora 
Ogum’s, Nandyala Editora, Pallas Editora, e a Editora Malê, esta última responsável
 pela publicação da mais recente obra de Conceição Evaristo.
Em cumprimento ao seu papel institucional de preservação, valorização, e promoção das culturas
 e dosconhecimentos afro-brasileiros, a Fundação Cultural Palmares realizou no ano de 2015 
a primeira edição do Prêmio Oliveira Silveira — homenagem ao poeta negro Oliveira Silveira,
 um dos líderes da campanha pelo reconhecimento do dia 20 de novembro como 
Dia da Consciência Negra.
 O projeto premiou e publicou cinco obras literárias inéditas do gênero romance, que tinham a 
cultura e história afro-brasileiras como temática. As obras vencedoras foram os romances 
Água de Barrela, de Eliana Alves dos Santos Cruz, Haussá 1815 – Comarca das Alagoas
de Júlio César Farias de Andrade, Sobre as vitórias que a história não conta, de André Luís Soares,
 Sina traçada, de Custódia Wolney, e Sessenta e seis elos, de Eduardo Carvalho. Todas obras 
são distribuídas nacionalmente pela Fundação Cultural Palmares, e os autores selecionados 
receberam um prêmio no valor de R$30 mil cada.