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quinta-feira, 9 de julho de 2015

Jozailto Lima: um minerador do poema ou papa-vento da palavra.

( Publicado na Revista Brasileiros-SP)


A poesia: uma questão de palavra, diz o poeta Jozailto e prosegue...” É um estado de palavra. É um estandarte feito de palavras e suor. Claro que, por vir disso, da palavra e do labor, ela está a serviço da humana genteO olho da pedra. Tudo isso, sendo pedra. Cartesiana. Meio matemática. Poesia é pintura feita a pincel de palavra. Carvão verbal

Jozailto Lima é jornalista e poeta e, como diria  Cacaso, “não nega sua raça, faz verso por pirraça e também por precisão”. Nasceu em Várzea do Poço, BA, em 11.11.1960, onde viveu até os 19 anos e está em Aracaju há vinte e três. É autor de quatro livros - “A Flor de Bronze e Outros Poemas de Mediamor”, 1986, trazido de Feira de Santana, “Plenespanto”, 1996, “Retrato Diverso”, 2004, e “Viagem na Argila”, 2012. Os três primeiros, premiados na Bahia e em Sergipe. Sua poesia faz profunda inquirição do sentido da existência, como lhe anteviu  Carlos Drummond de Andrade, em carta remetida em 1985: “gera e transmite emoção no seu grave sentimento de vida”. Ou, como disse Antônio Carlos Viana, “a poesia de Jozailto é uma poesia de ideias, enunciadas com forte tom emocional”. “Sem deixar de ser um homem do seu tempo, de seu torrão e, por consequência, do mundo”, arremataria Ronaldson Sousa. É diretor de Jornalismo do Cinform.

O poeta falou neste ano para a Revista Brasileiros, entre ondas e ventos da praia; ele é um disparador de palavras e assim atira versos, numa circunferência aberta. Amigo de poetas nacionais, incentivador dos que aparecem , mas não se desapega de Roverval Pereyr, poeta da Bahia, de Feira de Santana, Hunald de Alencar, José Ronaldson e Maria Lúcia Dal Farra, todos de Sergipe, Aracaju, entre tantos que ele louva, afora os clássicos do Brasil e do mundo. Ele é um comedor de livros sem indigestão.
Mas vamos digeri-lo assim, com seus poemas:

MÁCULA
Uma certa cicatriz/Que tenho e trago
Talha em mim/Esta dicção assim
Meio acre meio doce/Meio cica todo estrago.
(de “Retrato Diverso”)

ou

ECLESIASTES
Para Acácia Rios

Minha arma sou eu mesmo
O sol e a lua ajudam-me/a puxar o gatilho diário
na direção do mesmo alvo/na direção do mesmo ermo
Eu mesmo sou minha mira/Ardo. E ninguém, debaixo
do sol ou da lua, me desarma/Minha arma é minha alma
(de “Plenespanto”)

E, por fim, dá-nos uma chance de espiarmos inédito dele, do próximo livro (o quinto).

E ainda os lobos:

SEIVA (UMA POSSIBILIDADE)
sonho de morar no papel/e em sua seiva desidratada.
solenemente, habitar a celulose./ser o elo entre palavras,
traças e os sais da eternidade./ser madeira e ganir o segredo
da vida inteira no eixo do tempo./renovar a cada folha lançada
da árvore ao chão e do chão à árvore./abreviar o sonho da carne
e deliberadamente ser hermético/e uno e indivisível como a seiva.




quarta-feira, 17 de junho de 2015

Quinteto Violado -QV -41 Anos. : temperando a música brasileira e internacional


(Publicado na Revista Brasileiros
.SP)












No caminho da Mata ouvi um canto,
Asa na serra respondeu
Carcará num razante em rio sêco,
....
É o canto da terra,
Orvalho na serra,
A caatinga fulorou,
Mata Branca, padroeira...( Mata Branca = Caatinga -M.Melo)

 “Quando olhei a terra ardendo, qual fogueira de S. João...”( A. Branca.L Gonzaga/H.Teixeira  ) estas e outra músicas de Gonzaga  faziam parte do nosso acervo de família.Afora isto tinha Marinês e sua Gente,Rosil Cavalcanti  e J. do Pandeiro etc..Na época era o baião que se exportava para  o sudeste.Mas aprendi com o QV,  via Marcelo Melo,(violado)pesquisador e compositor da MPB a condição universal do nosso regional..
Em janeiro de 1970 o conjunto -apresenta-se pela primeira vez, sem nome próprio Q. Violado, na F.de Filosofia  UFPE. Em 1971, apresenta-se Nova Jerusalém (F. Nova PE), daí definitivamente: "os violados .

O quinteto, reacende nossa música nos anos 70 dando um caráter clássico/popular  à nossa música , dita regional, que não entendo o porquê, afinal não há música  que não tenha um pé no regional.

O Quinteto assim diz o poeta Dourado:
...” Paulo Freire Educação
Cangaço, Lucas de Feira
Na peleja e na rima
Malazarte e Canção...
tem Quinteto Violado
O Barro de Vitalino  ... “(http://migre.me/8appP)
Ou Xico Bizerra, citado  pelo saudoso Toinho Alves -violado:
’’ …A canção é a ferramenta

para violar luares

E por todos os lugares 

enluaramos violas ..”( http://bit.ly/yHD6S8)


Afora isto, o QV, trouxe-nos a palavra musicada e a cena dos folguedos/ritmos: cavalo marinho, pastoril, forro, baião,frevo ,xote, coco, cordel-emboladas,coco,maracatus, ciranda, o bumba meu boi etc, além de cantar Vandré( com quem gravou um LP/CD),Capiba,J.do Pandeiro ,Adoniran  etc. e composições próprias

Os violados, em suas  pesquisas ,trouxeram sangue  quente e virtuose à música  brasileira, mostrando ao mundo por seu muitos discos ,CDs  DVDs, um Brasil palavrado de expressões novas e arranjos Eles, ,juntam o popular e erudito, passando por filigranas jazistícas, sem tirar o foco de valorização do nacional, em que violão,contrabaixo,viola e,flauta,e safona, bem como teclados, engendram com as  suas vozes em  um novo melódico da MPB.

O primeiro  disco-LP-, Quinteto Violado em concerto,  Philips :1972, em que se incluía A. Branca  sucesso nacional e internacional com  prêmios recebidos .

Amigos do saudoso Gonzaga,em época de cáida midiática/fonográfica  deste, o quinteto realumiou o mesmo.Ele era padrinho dos violados , como assim o foi Hermilo B. Filho e Marcos Pereira, com quem o QV participou do projeto Música Popular do Nordeste 1973.

Gonzaga, certa vez, na década de 1980 na TV Cultura, predicou o QV de “sustança”, “tutano do corredor do boi”, e também “Padim Cícero”, “Frei Damião” e “Lampião.( http://bit.ly/yjVa7g)
J. Teles, PE, jornalista, pesquisador da MPB, lançou  -LA VÊM OS VIOLADOS da Ed. Bagaço-Pe, 2011vale conferir, assim como a produção do quinteto em seu site (http://migre.me/8arVN)  

quarta-feira, 20 de maio de 2015

No voo da palavra entre bichos e gente

BARTOLOMEU CAMPOS DE QUEIRÓS (1944-2013)
No voo da palavra entre bichos e gente
publicado pela Revista Brasileiros SP 
foto.Carta Capital





…A gente só fantasia o que não temos. Não fantasiamos o que temos. Então, a literatura é feita de falta. O que escrevo é o que me falta. É isso que a literatura faz. A literatura é o lugar da falta. Bartolomeu Campos  de Queirós
Dra.Ebe Maria de Lima Siqueira UFG/UEG
Paulo Vasconcelos

Principiamos com Ebe Maria de Lima Siqueira[i], professora, que já publicou livro sobre Bartolomeu Campos de Queirós e, na sua tese de doutorado volta ao escritor mineiro, situando-o entre autores canônicos da literatura brasileira, independente do público para quem escrevem. dentre outros autores de literatura infanto juvenil.

Conheci o Bartolomeu por intermédio da sua literatura, ainda na década de 90 e, de lá para cá, vivi na sua companhia, seja  pela literatura, seja em carne e osso pelo convívio com o poeta.
No princípio, eu cuidava de separar autor e sujeito empírico, por considerar o princípio aprendido na academia, que é claro em afirmar que não se pode confundir o homem com o autor. Entretanto, quanto mais eu me aproximava de sua obra, mais eu reconhecia nela o homem Bartolomeu. Os meninos, todos espalhados no tecido de seus  textos, reverberavam o menino Queirós: o que nasceu em Papagaio e que, desde cedo, descobriu que estava predestinado a revelar nas suas dores as dores de todos os meninos-homens do interior de Minas, do interior do Brasil, do interior de todos os lugares e de todos os tempo; o que foi, o de agora, e o que ainda virá.
O fato de ver a sua obra como exemplo de uma literatura sem fronteira foi o que me motivou a tomá-lo como objeto de estudo também na pesquisa de doutoramento. Nesse estudo, tive a oportunidade de situá-lo entre outros grandes da literatura nacional como Guimarães Rosa, Graciliano Ramos e Manoel de Barros. Estes escritores se aproximam, porque suas obras estão no entre lugar dos gêneros literários, têm como linha de força a experiência vivida e possibilitam a leitura de público bem diversificado independente da idade que tenham. Vermelho amargo, por exemplo, que a crítica especializada define como livro escrito para adulto, é um livro que pode ser lido por todas as idades. A diferença é que para que ele chegue até o público infantil será necessário a presença de um bom mediador, que não esteja guiado apenas pelos manuais das editoras.
O que podemos dizer de Vermelho amargo é que, em 40 anos de produção, o círculo de memórias se fecha com uma narrativa altamente biográfica. Mas se a linha do verso é longa e o seu teor se adensa em simbologias e metáforas, o livro aponta para a necessidade de uma mediação acurada, cuidadosa, capaz de escolher melhores estratégias, o melhor momento de iniciar e de interromper a leitura para que o texto se torne uma realidade acessível ao leitor, que precisa desejá-lo, para, só nessa condição, fazê-lo seu.Vermelho Amargo coloca o poeta mineiro em sintonia com Fernando Pessoa, ambos a fingirem a dor que deveras sentem: “Dói. Dói muito. Dói pelo corpo inteiro”, Uma “dor que vem de afastadas distancias” (QUEIRÓS, 2011, p. 7-8) 
Embora tenha escrito também narrativas despretensiosas, como se estivesse apenas recordando seu percurso de alfabetização, que são, por exemplo, Diário de Classe (2003), Raul (1986), As patas da vaca (1989), O guarda chuva do guarda (2010), sua grandeza como escritor se concentra nas narrativas de caráter autobiográfico, que têm início com a publicação do livro Indez, em 1989. Indez inaugura um pacto autobiográfico que autoriza o leitor a perceber que o discurso literário é lugar de acolhimento de muitas vozes, entre elas a do autor empírico, homem como todos os outros, marcado por muitos medos, e entre eles o medo do esquecimento, que o leva a ficcionalizar-se. 
O mesmo procedimento se repete em Ciganos (1994), Por parte de Pai (1996), Ler escrever e fazer conta de cabeça (1996) O olho de vidro do meu avô (2004), Antes do Depois (2006). Em todos esses livros o que se percebe, de imediato, é uma disposição anímica que pressupõe uma projeção do estado de alma, uma vez que os sentimentos, todos os estados mais recônditos e profundos do íntimo, estão entrelaçados com a paisagem, com uma estação do ano, com um estado da atmosfera. Não há uma exigência de que a narrativa seja filtrada por uma primeira pessoa, mas o que se mantém é sempre a escolha de uma retórica intimista, diminuindo a distância entre quem escreve e quem lê.
Bartolomeu concentra o cerne de sua narrativa no fato de narrar a sua própria experiência, por fiar a memória da família, melhor alternativa para guardá-la do esquecimento, porque sua escritura, além de ter a memória como fulcro, como já lembramos, tem suas fontes na infância.
O autor escreve a contrapelo de alguns princípios da modernidade, ao trazer a experiência novamente para dentro do homem. Quer devolver ao homem aquilo de que foi expropriado pela crença de que tudo seria explicado pela ciência moderna.
Vislumbrar em sua obra a expressão do literário, que é o mesmo que lhe atribuir “esplendor estético” (BLOOM, 2005, p. 13), com a função de “revelar que habitamos a terra, não só prosaicamente – sujeitos à utilidade e à funcionalidade -, mas também poeticamente, destinados ao deslumbramento, ao amor, ao êxtase. (MORIN, 2010, p. 45)

                                         Foto por Abril.Cultural

Barto foi um pássaro bigudo catando palavras sobre o tempo e, assim, buscando um reino do letrável, como ele próprio disse. Aprendeu em casa a ler e escrever antes de entrar na Escola através de seu avó paterno, este escrevinhava pelas paredes da casa toda, notícias do cotidiano e outras, as mais curiosas ou para adultos, eram escritas  no alto da parede para evitar que os netos e outros vissem, lessem. Esse fato levou o menino a ter um gosto inusitado, como por pelo avesso a palavra, ou não dar destino certo. O avó era uma figura e tanto que lhe desbocou para não ter medo de enfinhar-se pelos meandros, meios, nas canelas das palavras. Era escutador da avó que lhe contava histórias senta da num penico, arrodeada dos netos. Esse modo de vida, desprovido, e ligado à terra e a família lhe permitiu transportar para a literatura, toda uma brasilidade mineira, e que se confunde com muitas outras, dizendo de modo simples e terno a vida.
De suas entrevistas, dentre elas, destacamos uma das últimas conhecida sem 2011 ao jornalista Rogério Pereira no Teatro Paiol, Curitiba (PR), http://bit.ly/HQaEVN

Assim temos:
“Literatura – o grande patrimônio que temos é a memória. A memória guarda o que vivemos e o que sonhamos. E a literatura é esse espaço onde o quê sonhamos encontra o diálogo. Com a literatura, esse mundo sonhado consegue falar…




O texto literário é um texto que também dá voz ao leitor. Quando escrevo, por exemplo: “A casa é bonita”, coloco um ponto final. Quando você lê para uma criança “A casa é bonita”, para ela pode significar que tem pai e mãe. Para outra criança, “casa bonita” é a que tem comida. Para outra, a que tem colchão. Eu não sei o que é casa bonita, quem sabe é o leitor. A importância para mim da literatura é também acreditar que o cidadão possui a palavra. O texto literário dá a palavra ao leitor. O texto literário convida o leitor a se dizer diante dele. Isso é o que há de mais importante para mim na literatura…”

Iniciou-se à toa, pelo fantástico da palavra e imaginação, de repente, sai O peixe e  pássaro-1971-prêmio literatura Infantil.Com o livro ele desmitifica a literatura chamada Infantojuvenil. A obra é uma grande poesia, literatura para todos, sempre, como assim o apresentou Henriqueta Lisboa, que em contracapa do livro nos diz: “Sem resposta definitiva, algumas vezes me fiz esta pergunta: Como reconhecer a poesia? Muitas vezes pude identificá-la, respirá-la tocá-la, guarda-la nos olhos, nos ouvidos e coração....” Henriqueta, a grande poetisa mineira já via o futuro de Bartolomeu, a poesia. Mesmo entrando pela prosa, ele a enxertou-a de poesia, como só os bons fazem.
Com uma obra que ultrapassa 40 livros, Bartolomeu foi premiado, trabalhou com o eixo da leitura, para difusão do livro, premiado nacional e internacionalmente, nos marcou recentemente, o ano passado com sua obra Vermelho Amargo. Post mortem aparece O elefante, obra curta, mas sempre nos seu moldes do bicho e da prosa poética.












Bartolomeu Campos de Queirós  ou Bartô nasceu em Papagaios MG (1944-2013)
Aos  seis anos perde a mãe, passa por Divinopolis, Juiz de Fora. Em seguida Belo horizonte, onde faz Filosofia e inicia suas atividades ligadas a Educação. Será na França que escreverá seu primeiro livro O peixe e o pássaro.
Foi presidente da Fundação Clóvis Salgado/Palácio
das Artes e membro do Conselho Estadual de Cultura, ambos em Minas Gerais. Idealizou o Movimento por um Brasil Literário.
Recebeu condecorações como Chevalier de l’Ordredes Arts et des Lettres (França), Medalha Rosa Branca (Cuba), Grande Medalha da InconfidênciaMineira e Medalha Santos Dumont (Governo do estado de Minas Gerais). Ganhou ainda o Grande Prêmio da Crítica em LiteraturaInfantil/Juvenil da
AssociaçãoPaulista de Críticos de Arte (APCA), Jabuti e Academia Brasileira de Letras.











































[i]Doutora em Estudos Literários pela Universidade Federal de Goiás. Professora da Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária da Cidade de Goiás